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sexta-feira, março 29, 2019

Entenda a crise no Ministério da Educação em 4 pontos


Gestão Vélez enfrenta disputa entre dois grupos; saldo é série de demissões e risco de prejuízo para execução de programas e cumprimento de metas previstas em lei.

 

Por Ana Carolina Moreno, G1

 O ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, em imagem de janeiro de 2019 — Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil 

O ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, em imagem de janeiro de 2019 — Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil.

O Ministério da Educação, dono de um dos maiores orçamentos do governo federal, vive uma crise que se arrasta desde a metade de janeiro. 


Uma disputa interna opõe dois grupos que têm visões distintas de como a pasta deve operar. 


O saldo até agora é a demissão de mais de uma dezena de funcionários de alto escalão, cancelamento de decisões, pedidos de desculpas, além do risco para a execução de metas e programas prioritários. 


O G1 tenta junto ao MEC desde o começo da gestão entrevistas ou posicionamentos sobre estratégias, metas e explicações a respeito dos problemas da área. 


Diante de respostas insuficientes ou da falta delas, a equipe de reportagem ouviu pessoas envolvidas com a pasta, mas que preferiram manter o anonimato. 


Entre as fontes, cujas identidades serão preservadas, estão pessoas que estiveram na equipe de transição, estão no atual quadro de funcionários ou foram demitidos recentemente. 


O relato deles responde às seguintes perguntas: 
  • Qual é o motivo da crise?
  • O que quer cada um dos grupos?
  • Quais áreas os grupos ocupam no MEC e autarquias?
  • Quais são as consequências e riscos dessa divisão?


Veja as respostas abaixo e detalhes na cronologia ao fim do texto: 

Qual é o motivo da crise?

 

Há uma disputa interna na área da educação sobre qual projeto de governo deve ser implementado. 


Os grupos em conflito poderiam ser chamados de “pragmáticos” e “ideológicos”. 

Os "pragmáticos" são os militares, incluindo generais que foram os primeiros a serem envolvidos na campanha de Bolsonaro. 


Este grupo também inclui ao menos um coronel que tem afinidades com o ministro. 

Os "ideológicos" são os seguidores do escritor de direita Olavo de Carvalho e também ex-alunos do ministro Vélez. 


Vale lembrar que o próprio Vélez foi indicado por Carvalho. 

O que quer cada um dos grupos?

 

Pate da ala militar dentro do MEC pode ser considerada mais pragmática: parte dela ajudou na elaboração das propostas de campanha de Bolsonaro, que incluíam a defesa da educação a distância, a criação de colégios militares em capitais e a modernização da gestão na pasta.


Os olavistas chegaram ao staff sobretudo depois da vitória de Bolsonaro, causando atritos com os que já estavam contribuindo nas discussões sobre educação desde a campanha. 


O principal ponto para esse grupo “ideológico” é expulsar do MEC qualquer resquício do que chamam de “marxismo cultural” ou “pensamentos esquerdistas”. 



Isso inclui a defesa de projetos como o Escola Sem Partido, revisão de questões do Enem ou ensino que aborde questões de gênero nas escolas. 


De acordo com as fontes ouvidas pelo G1, o grupo ideológico também tem restrições à atuação do Conselho Nacional de Educação (CNE), a implementação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) e a pontos do Plano Nacional de Educação (PNE). 

Quais áreas os grupos ocupam no MEC e autarquias?

 

Os olavistas ocupam cargos sobretudo nas principais posições do MEC, como a nova Secretaria de Alfabetização (Sealf), enquanto os militares comandam áreas de órgãos como o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) e o Fundo Nacional para o Desenvolvimento da Educação (FNDE). 


O próprio ministro Ricardo Vélez Rodrigues é uma indicação de Olavo e, segundo fontes ouvidas pelo G1, ele foi nomeado sem consulta aos militares. 

Outros nomes eram considerados para titular da pasta: Maria Inês Fini, então presidente do Inep, Mozart Neves Ramos, diretor do Instituto Ayrton Senna e o professor da FGV Stavros Xanthopoylos, ligado aos militares da campanha. 


As nomeações não se concretizaram porque a ala olavista considerou os indicados ineptos por uma suposta identificação com temas de esquerda ou ligação com partidos políticos como PSDB ou DEM. 

Os olavistas ocuparam ainda cargos de diretores de programas ou assessores especiais ligados diretamente ao ministro ou à Secretaria-Executiva. 

Já os indicados ligados aos generais ficaram sobretudo à frente do Inep, da Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh) e do FNDE.
Entretanto, um militar que ganhou a confiança de Vélez durante a transição (o coronel Ricardo Wagner Roquetti, que foi pró-reitor do Instituto Tecnológico de Aeronáutica) ganhou cargo na secretaria-executiva e, a partir dele, se consolidou a nomeação de uma série de nomes com perfis pragmáticos, alguns deles com trajetória no universo da educação técnica paulista. 

Quais são as consequências e riscos dessa divisão?

 

Na prática, o racha já provocou uma série de decisões revogadas e demissões dentro da pasta. 


Mais de 10 pessoas já foram demitidas e posições importantes dentro da pasta e do Inep estão vagas. 

A disputa também pode afetar programas importantes, como o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) de 2019. 


Apesar de ser aplicado apenas em novembro, a prova é pensada durante todo o ano: o cronograma estipula que as provas já estejam prontas para o envio às gráficas no início de maio.

A educação básica e a implementação da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) também são áreas que, apesar de não serem de oferta direta do MEC, podem sofrer com a persistência da crise dentro do ministério, já que as redes estaduais e municipais dependem da articulação com o governo federal para tirar do papel os programas que precisam ser executados dentro das escolas. 

Entenda quem são os citados no texto.

 

Ricardo Vélez Rodriguez – atual ministro da Educação; nasceu na Colômbia e naturalizou-se brasileiro em 1997, é autor de mais de 30 obras e é professor emérito da Escola de Comando do Estado Maior do Exército
Olavo de Carvalho – escritor de direita, é apontado como um dos influenciadores do governo Bolsonaro

Maria Inês Fini – ex-presidente do Inep; foi nomeada durante a gestão Michel Temer e exonerada por Vélez; já havia trabalhado no Inep na gestão de Fernando Henrique Cardoso, e foi uma das idealizadoras do Enem
Mozart Neves Ramos - diretor do Instituto Ayrton Senna; chegou a ser citado como ministeriável, e atualmente é conselheiro do Conselho Nacional de Educação
Stavros Xanthopoylos - professor da FGV, participou da equipe de elaboração do programa de campanha de Bolsonaro para a educação; é especialista e entusiasta da educação a distância
Crise no MEC: veja cronologia até 29 de março — Foto: Infográfico: Diana Yukari, Juliana Monteiro e Roberta Jaworski /G1 
Crise no MEC: veja cronologia até 29 de março — Foto: Infográfico: Diana Yukari, Juliana Monteiro e Roberta Jaworski /G1.

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