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terça-feira, agosto 14, 2012

Belo Monte, nosso dinheiro e o bigode do Sarney


Um dos mais respeitados especialistas na área energética do país, o professor da USP Célio Bermann, fala sobre a “caixa preta” do setor, controlado por José Sarney, e o jogo pesado e lucrativo que domina a maior obra do PAC. Conta também sua experiência como assessor de Dilma Rousseff no Ministério de Minas e Energia

ELIANE BRUM


















ELIANE BRUM Jornalista, escritora e
documentarista. Ganhou mais
de 40 prêmios nacionais e
internacionais de reportagem.
É autora de um romance -
Uma Duas (LeYa) - e de três
livros de reportagem: Coluna
Prestes – O Avesso da Lenda
(Artes e Ofícios), A Vida Que
Ninguém Vê
(Arquipélago
Editorial, Prêmio Jabuti 2007)
e O Olho da Rua (Globo).
E codiretora de dois
documentários: Uma História
Severina e Gretchen Filme
Estrada.
elianebrum@uol.com.br
@brumelianebrum 

Se você é aquele tipo de leitor que acha que Belo Monte vai “afetar apenas um punhado de índios”, esta entrevista é para você. Talvez você descubra que a megaobra vai afetar diretamente o seu bolso. Se você é aquele tipo de leitor que acredita que os acontecimentos na Amazônia não lhe dizem respeito, esta entrevista é para você. Para que possa entender que o que acontece lá, repercute aqui – e vice-versa. Se você é aquele tipo de leitor que defende a construção do maior número de usinas hidrelétricas já porque acredita piamente que, se isso não acontecer, vai ficar sem luz em casa para assistir à novela das oito, esta entrevista é para você. Com alguma sorte, você pode perceber que o buraco é mais embaixo e que você tem consumido propaganda subliminar, além de bens de consumo. Se você é aquele tipo de leitor que compreende os impactos socioambientais de uma obra desse porte, mas gostaria de entender melhor o que está em jogo de fato e quais são as alternativas, esta entrevista também é para você.

Como tenho escrito com frequência sobre a megausina hidrelétrica de Belo Monte, por considerar que é uma das questões mais relevantes do país no momento, observo com atenção as manifestações dos leitores que comentam neste espaço ou em redes sociais como o Twitter. Anotei as principais dúvidas para incluí-las aqui e assim colaborar com o debate.

Desta vez, propus uma conversa sobre Belo Monte a Célio Bermann, um dos mais respeitados especialistas do país na área energética. Bermann é professor do Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo (USP), com doutorado em Planejamento de Sistemas Energéticos pela Unicamp. Publicou vários livros, entre eles: “Energia no Brasil: Para quê? Para quem? – Crise e Alternativas para um País Sustentável” (Livraria da Física) e “As Novas Energias no Brasil: Dilemas da Inclusão Social e Programas de Governo” (Fase). Ex-petista, ele participou dos debates da área energética e ambiental para a elaboração do programa de Lula na campanha de 2002 e foi assessor de Dilma Rousseff entre 2003 e 2004, no Ministério de Minas e Energia. Célio Bermann foi também um dos 40 cientistas a se debruçar sobre Belo Monte para construir um painel que, infelizmente, foi ignorado pelo governo federal.

Vale a pena ouvir o professor a qualquer tempo. Mas, especialmente, depois de uma semana dramática como a passada. Na quarta-feira (26/10), o julgamento da ação movida pelo Ministério Público Federal reivindicando que os índios sejam ouvidos sobre a obra, como determina a Constituição, foi interrompida e adiada mais uma vez no Tribunal Regional Federal da 1ª Região, em Brasília. Na mesma quarta-feira, chamado pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) para explicar por que não suspendeu as obras de Belo Monte, o Brasil não compareceu, desrespeitando o organismo internacional e exibindo um comportamento mais usual em ditaduras. Em reportagem publicada em 20/10, o Estadão denunciou que, como retaliação por ter sido advertido sobre Belo Monte, o Brasil deixou de pagar sua cota anual como estado-membro.

Na quinta-feira (27/10), centenas de pessoas, entre indígenas, ribeirinhos e moradores das cidades atingidas, ocuparam pacificamente o canteiro de obras de Belo Monte, no rio Xingu, pedindo a paralisação da construção da usina. Foram expulsos por ordem judicial. Enquanto o canteiro de obras era ocupado por uma população invisível para o governo de Dilma Rousseff, o cineasta Daniel Tendler apresentava no Seminário Nacional de Grandes Barragens, no Rio de Janeiro, o projeto de uma megaprodução cinematográfica que se propõe a documentar as obras de Belo Monte por cinco anos. O projeto é comandado pela LC Barreto, a produtora da poderosa família Barreto, a mesma que fez “Lula, O Filho do Brasil”. Tendler, aliás, foi um dos roteiristas do filme sobre a vida do ex-presidente. Entre as repercussões da megaprodução cinematográfica sobre a megaobra do PAC no Twitter, destacou-se uma: “Os Barreto estão para o cinema nacional como os Sarney para a política”.

Ainda na semana passada, o governo federal publicou um pacote de sete portarias ministeriais com o objetivo de “destravar a concessão de licenças ambientais no país para acelerar grandes empreendimentos, como rodovias, portos, exploração de petróleo e gás, hidrelétricas e até linhas de transmissão de energia”. Ou seja: o governo caminha para anular as conquistas socioambientais obtidas na redemocratização do país.

Dias antes, em 26/10, o Senado havia aprovado um projeto de lei que retira o poder do Ibama para multar crimes ambientais, como desmatamentos. Se não for vetado pela presidente, o poder de multar passará para estados e municípios, sujeito às pressões locais já bem conhecidas. A aprovação do projeto aconteceu quatro dias depois de mais um assassinato no Pará: João Chupel Primo, mais conhecido como João da Gaita, foi morto com um tiro na cabeça, depois de denunciar ao Ministério Público Federal, em Altamira, uma rota de desmatamento ilegal na reserva extrativista Riozinho do Anfrísio e na Floresta Nacional Trairão, área do entorno de Belo Monte. Como de hábito, o Congresso decide os rumos do país desconectado com o que acontece na vida real para além do aquário brasiliense.

No momento histórico em que recursos como água e biodiversidade se consolidam como o grande capital de uma nação, o Brasil, um dos países mais beneficiados pela natureza no planeta, corre em marcha à ré. O cenário que você acabou de ler tem no centro – como obra simbólica e estratégica – Belo Monte, a maior obra do PAC. A seguir, parte de minha conversa de quase três horas com o professor Célio Bermann, em sua sala no Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP.    

- Por que o senhor, assim como outras pessoas que estudam o setor, afirma que a área energética do país é uma “caixa preta”. Afinal, que caixa preta é essa?
Célio Bermann – A política energética do nosso país é uma caixa preta e é mantida dessa forma por uma série de razões. Primeiro, porque a baixa escolaridade da população brasileira não permite, por exemplo, que o leitor da Época entenda o que é terawatts-hora. Mas seria interessante que a população toda tivesse conhecimento e pudesse, com informação, começar a definir junto com empresas e governo os rumos que são mais adequados. Acho que a academia tem um papel fundamental nesse processo. Eu, particularmente, tento, na área do meu conhecimento, procurar as populações tradicionais, mostrar o que é uma usina hidrelétrica, por que alaga quando você interrompe o fluxo, o que é uma barragem, e como isso vai acabar transformando a vida da comunidade. Acho importante que a academia preste esse tipo de informação, já que governo e empresas não o fazem.

- Sim, mas por que o setor energético tem sido uma caixa preta por décadas?
Bermann -
A governabilidade foi encontrada através de uma aliança que mantém o círculo de interesses que sempre estiveram no nosso país. É a mesma turma que continua na área energética. E isso é impressionante. A população não participa do processo de decisões. Não existem canais para isso. Ainda no governo FHC, durante a privatização, o governo criou um Conselho Nacional de Política Energética. Nos dois mandatos de FHC participavam os dez ministros, mas havia um assento para um representante da academia e um da chamada sociedade civil. Eles sentavam, discutiam as diretrizes energéticas de uma forma aparentemente saudável, mas, no frigir dos ovos, na prática não mudava nada. De qualquer forma, havia pelo menos esse sentido de escutar. Isso, com Lula, acabou. O resultado do governo "democrático popular" do Lula, nos dois mandatos, e da Dilma, agora, é a negação de escutar outros interesses que não sejam aqueles que sempre estiveram junto ao poder. A própria Dilma, no início do governo Lula, tinha uma dificuldade muito grande de ouvir, de sentar-se com os movimentos sociais e ouvir. Eu tive a oportunidade de vivenciar o primeiro mandato do Lula, lá, em Brasília.

- E qual era o seu papel?
Bermann –
Era apagar fogo, este era o meu papel...
- Mas, oficialmente...
Bermann -
O meu papel era tentar amenizar um pouco os conflitos, mas, oficialmente, eu fui trabalhar com a Dilma como assessor ambiental no Ministério de Minas e Energia. A ideia inicial era criar uma Secretaria de Meio Ambiente dentro do ministério. Era a época em que tínhamos a Marina (Silva) falando em transversalidade, então havia um ambiente extremamente propício para aparar arestas e ver se a coisa poderia caminhar de uma forma mais adequada. Achei, então, que a melhor forma de fazer isso não era criar um lugar dos ambientalistas no ministério, mas colocar em todas as secretarias do ministério gente que pensasse o meio ambiente. Mas acabei ficando um ano lá em Brasília. Mesmo assim, foi extremamente interessante, porque me permitiu sair da academia e ter, na prática, a percepção de como as coisas se dão no dia a dia dentro do governo.
- E como as coisas se dão no dia a dia dentro do governo?

Bermann –
É um horror. É uma lentidão. É um imobilismo. É incrível a capacidade da máquina de governo de fazer de conta que faz sem estar fazendo absolutamente nada. Eu falo isso com todos os pontos nos “is”. No início do governo se buscava um entendimento entre os chamados "ministérios fins" e o meio ambiente. Transportes, por causa da construção de estradas e portos, e Minas e Energia, por causa da atividade mineral, metalúrgica e energética, e as questões ambientais que são intrínsecas a essas atividades. Houve uma boa intenção de levar adiante a possibilidade do estabelecimento de pontos comuns. Fizemos, então, um acordo entre Ministério de Minas e Energia e Ministério do Meio Ambiente em função da definição de "pontos comuns", de procurar verificar onde poderíamos estabelecer alguns consensos. Era um documento em que se definia uma agenda energética e ambiental comuns aos dois ministérios. Se bem me lembro, o documento foi concluído em setembro de 2003. Mas as duas ministras só foram assinar em 31 de março de 2004.

- Por quê?
Bermann –
Boa pergunta. Por quê? Boas intenções... mas por quê? Eu realmente não consigo definir exatamente se era uma questão de veleidade... não sei. No final de 2003 a Marina começou a perceber a dificuldade de ela continuar, e o Lula, daquele jeito dele, deixando a coisa acontecer. Naquele momento, o governo poderia ter tido uma agenda comum, um processo extremamente positivo de entender que existem usinas hidrelétricas que não devem ser construídas.

Em 2003, a Dilma estava feliz porque tinha conseguido afastar a turma do Sarney do setor elétrico"
Célio Bermann
- Imagino que não era fácil ser assessor ambiental da Dilma Rousseff...
Bermann -
É, foi uma coisa meio... difícil. Como falei, eu tinha uma relação particular com os movimentos sociais e estava mais numa situação de bombeiro. Vou te contar uma coisa, como referência. Eu encontrei a Dilma na posse do (físico) Luiz Pinguelli Rosa, no Rio de Janeiro, como presidente da Eletrobrás. Ela estava extremamente satisfeita, alegre, contente, porque tinha conseguido, politicamente, afastar a turma do (José) Sarney da seara energética. (Luiz Pinguelli Rosa deixaria o cargo em 2004, a pedido de Lula, que precisava colocar alguém ligado ao PMDB e a José Sarney.) Para você ver. Na época, o (José Antonio) Muniz (Lopes) era diretor da Eletronorte... e depois tornou-se presidente da Eletrobrás (de 2008 a 2011). 

- O José Antonio Muniz Lopes, um homem da cota do Sarney, é um personagem longevo nessa história de Belo Monte... Só para situar os leitores, em 1989, no último ano do governo Sarney, ele era diretor da Eletronorte e foi no rosto dele que a índia caiapó Tuíra encostou seu facão por causa da proposta de Belo Monte (então chamada de Kararaô), naquela foto histórica que correu mundo. O tal do Muniz já estava lá... Depois de deixar a presidência da Eletrobrás, no início deste ano, continuou lá, agora como diretor de Transmissão da Eletrobrás...

Bermann –
Pois então. Naquela época, em 2003, era ele o diretor da Eletronorte que a Dilma tinha ficado feliz por ter conseguido afastar. Por isso que eu falo que não é o governo Lula, é o governo Lula/Sarney. E agora Dilma/Sarney. Constituiu-se um amálgama entre os interesses históricos do superfaturamento de obras, sempre falado, nunca evidenciado. Não se trata de construir uma usina para produzir energia elétrica. Uma vez construída, alguém vai precisar produzir energia elétrica, mas não é para isso que Belo Monte está sendo construída. O que está em jogo é a utilização do dinheiro público e especialmente o espaço de cinco, seis anos em que o empreendimento será construído. É neste momento que se fatura. É na construção o momento onde corre o dinheiro. É quando prefeitos, vereadores, governadores são comprados e essa situação é mantida. Estou sendo muito claro ao expor a minha percepção do que é uma usina hidrelétrica como Belo Monte. 

- No momento em que o senhor encontrou a Dilma, logo na constituição da equipe do primeiro mandato de Lula, o senhor conta que ela estava feliz porque tinha conseguido tirar a turma do Sarney do comando da área energética. O que aconteceu a partir daí?
Bermann -
A pergunta é: tirou mesmo?

- E qual é a resposta?
Bermann -
Naquele momento, manter esse pessoal à distância era estratégico para reconstruir as relações e viabilizar algumas das diretrizes que tinham sido objeto da proposta de governo. O que aconteceu é que a vida dessa situação (de afastamento) foi extremamente curta devido às relações de poder. Eles não gostaram de se sentir afastados. E eu suponho que a percepção do problema da governabilidade no governo Lula foi uma ação desses setores que tinham percebido que estavam longe da teta da vaca e que não podiam continuar assim. Qual era o jeito de fazer? PMDB era oposição. Vamos conversar... E aí se reacomodam as questões. Eu não digo que seja um grupo de ladrões mercenários. Não é isso que está em jogo. Mas essa capilaridade do Sarney permite manter o usufruto do poder. Eu não sou psicólogo para entender o que o senhor Sarney pensa quando vê o Muniz voltar para o governo, ou quando se encontra diante da incapacidade técnica do senador Edison Lobão ao conduzir o Ministério de Minas e Energia no governo Lula e agora no de Dilma. Não há lógica para isso. Vou dizer de novo: não é possível a gente acreditar na capacidade gerencial de um governo que se submete a esse tipo de articulação política, colocando uma pessoa absolutamente incapaz de entender o que é quilowatt, quilowatt-hora. De ir a público sem saber a diferença entre tensão em volts e energia em quilowatts-hora. 
- O senhor está falando do ministro de Minas e Energia, Edison Lobão?

Bermann-
Edison Lobão. 
- E Belo Monte ocupa que lugar nesse jogo?
Bermann -
É a oportunidade de se fazer dinheiro e de se reconstituir as relações de poder. Essa obra tinha sido sepultada em 1989, por conta da mobilização da população indígena, e voltou à tona no governo Lula, aprovada pelo Congresso (em 2005) com o discurso de que era um novo projeto. 
“O valor de Belo Monte aumentou em mais de R$ 20 bilhões em apenas cinco anos. E deverá ser maior ainda. Sem contar que 80% do financiamento é dinheiro público"
Célio Bermann
- A ameaça de retomar Belo Monte esteve presente também durante o governo Fernando Henrique Cardoso, mas só no governo Lula saiu mesmo do papel, o que ninguém imaginava que acontecesse, devido ao apoio massivo dos movimentos sociais da região à campanha de Lula. O senhor acha que o fato de Belo Monte ter saído do papel tem a ver com a denúncia do Mensalão, em 2005, e a recomposição das forças políticas para a eleição de 2006?
Bermann - Não tenho a mínima ideia. Mas vamos falar em cifras, agora. Em 2006 o projeto foi anunciado com um custo de R$ 4,5 bilhões. Você sabe, as cifras avançaram violentamente. Antes de ir para o leilão, a usina foi avaliada em R$ 19 bilhões. Foi feito o leilão e se definiu um custo fictício de geração de energia elétrica de R$ 78 o megawatt-hora.
- Por que fictício?

Bermann -
Fictício porque esse custo não remunera o capital investido. É por isso que várias empresas caíram fora do empreendimento, sob o ponto de vista da geração da energia elétrica. Mas as grandes empreiteiras estão presentes, porque não é na venda da energia elétrica, mas sim na obra que se dá uma parte significativa da apropriação da renda. Com o consórcio constituído com 50% entre Eletrobrás e Eletronorte, as empreiteiras voltaram para fazer a obra. A elas interessa a obra – e não ficar vendendo energia elétrica. Essa situação é entendida pelos dirigentes, pelo governo, como normal. Para o governo federal, é uma parceria público-privada que está dando certo. Em que termos? A obra hoje está oficialmente orçada em R$ 26 bilhões. Imagine, de R$ 4,5 bilhões para R$ 26 bilhões...

- Em cinco anos, o valor da obra avançou em mais de R$ 20 bilhões?
Bermann –
Oficialmente está hoje orçada em R$ 26 bilhões. Mas existem estimativas de que não vai sair por menos de R$ 32 bilhões. Isso sem falar em superfaturamento.
- Deste valor, quanto sairá do BNDES, ou seja, do nosso bolso?
Bermann –
Oitenta por cento da grana para isso é dinheiro público. O que estamos testemunhando é um esquema de engenharia financeira para satisfazer um jogo de interesses que envolve empreiteiras que vão ganhar muito dinheiro no curto prazo. Um esquema de relações de poder que se estabelece nos níveis local, estadual e nacional – e isso numa obra cujos 11.200 megawatts de potência instalada só vão funcionar quatro meses por ano por causa do funcionamento hidrológico do Xingu. Então, é preciso entender que a discussão sobre a volta da inflação não se dá porque está aumentando o preço da cebola, do tomate, do leite... É por causa da volúpia de tomar recursos públicos que será necessário fabricar dinheiro. O ritmo inflacionário vai se dar na medida em que obras como Belo Monte forem avançando e requerendo que se pague equipamento, que se pague operários, que se pague uma série de coisas e também que se remunere com superfaturamento.

Com Belo Monte, ganham as empreiteiras e os vendedores de equipamentos. E ganham os políticos que permitem que essa articulação seja possível"
Célio Bermann

- Quem perde a gente já sabe. Agora, quem ganha, além das empreiteiras envolvidas na obra?
Bermann -
Há as pessoas que ganham pela obra - fabricantes de equipamentos, empreiteiras. E há quem ganhe não financeiramente, mas politicamente, por permitir que essa articulação seja possível, porque é esse pessoal que vai bancar a campanha para o próximo mandato. É a escolinha ou o posto de saúde que eventualmente aquele vereador, aquele prefeito vai dizer: "É obra minha!". É isso que está em jogo. É dessa forma que a cultura política se estabelece hoje no nosso país. Isso precisa mudar. Como? É complicado.

- O senhor costuma usar a expressão “Síndrome do Blecaute” para se referir ao pânico da população de ficar à luz de velas devido a um apagão energético. Acredita que essa “síndrome” é manipulada pelo governo federal e pelos grandes interesses empresariais para emprestar um caráter de legitimidade a megaobras como Belo Monte?

Bermann –
O que eu tenho chamado de "Síndrome do Blecaute" conduz à legitimação de empreendimentos absolutamente inconsistentes. Belo Monte, como foi provado pelo conjunto de cientistas que se debruçaram sobre o tema (painel dos especialistas), é uma obra absolutamente indesejável sob o ponto de vista econômico, financeiro e técnico. Isso sem falar nos aspectos social e ambiental. Mas se dissemina uma ideia do caos e, hoje, há 77 projetos de usinas hidrelétricas somente na Amazônia que utilizam a "Síndrome do Blecaute" para se viabilizarem. O fato de hoje o aquecimento global dominar a mídia e o senso comum, assim como a própria academia, ajuda a mostrar a hidroeletricidade como uma grande maravilha, independentemente do lugar em que a usina vai ser construída e dos impactos que ela vai causar. Mas o que é preciso compreender e questionar? Hoje, seis setores industriais consomem 30% da energia elétrica produzida no país. Dois deles são mais vinculados ao mercado doméstico, que é o cimento e a indústria química. Mas os outros quatro têm uma parte considerável da produção para exportação: aço, alumínio primário, ferroligas e celulose.

- As chamadas indústrias eletrointensivas...
Bermann –
Isso. Eu não estou defendendo que devemos fechar as indústrias eletrointensivas, que demandam uma enorme quantidade de energia elétrica a um custo ambiental altíssimo. Mas acho absolutamente indesejável que a produção de alumínio dobre nos próximos 10 anos, que a produção de aço triplique nos próximos 10 anos, que a produção de celulose seja multiplicada por três nos próximos 10 anos. E é isso que está sendo previsto oficialmente.
- O que poucos parecem perceber e menos ainda questionam, quando essas metas são comemoradas, é a forma como o Brasil está inserido no mercado internacional em pleno século XXI. O quanto o fato de nossa economia estar baseada na exportação de bens primários tem a ver com a necessidade de grandes hidrelétricas?

Bermann –
Desde a ditadura militar, passando pela redemocratização, pelos sucessivos governos até FHC, tem sido assim. Nós imaginávamos que, com Lula, essa questão ia ser reorientada. Porque o programa de governo em que eu me envolvi preconizava a necessidade dessa mudança. E o que aconteceu? Se você comparar os dados de 2001 com os dados de 2010, vai constatar que a economia brasileira está se primarizando cada vez mais. Isto é: cada vez mais são produzidos no Brasil bens industriais primários, sem agregação de valor. E são justamente os bens primários que consomem muita energia e geram pouco emprego. Além disso, satisfazem uma demanda marcada pelo consumismo. E o Brasil se mostrou incapaz de dizer: "Não, nós não vamos fazer isso".
- E depois esses produtos retornam para o Brasil, via importação, com valor agregado...
Bermann –
É. Eu sempre chamo a atenção para o fato de que, do alumínio primário que o Brasil produz, 70% é exportado. E o alumínio consome muita energia. Para se pegar um barro vermelho, que é a bauxita, e transformá-la em alumínio, é preciso um processo de produção extremamente devastador sob o ponto de vista ambiental. Há um primeiro refino para obter a alumina, que é um pó branco. Esse pó branco tem como consequência ambiental uma borra chamada de “lama vermelha”. Um ano atrás, na Europa, na Hungria, houve uma catástrofe em função do rompimento de uma barragem que continha essa lama vermelha e tóxica. Ela se espalhou pelo Rio Danúbio e foi um horror. E cada vez mais se faz isso no nosso país – e, claro, não se faz mais isso nos países centrais. Isso não está acontecendo agora no Brasil, está acontecendo desde os anos 70.

“Com Lula – e agora com Dilma – ocorreu a reprimarização da economia, com exportação de bens primários sem valor agregado, numa subordinação ao mercado internacional"
Célio Bermann

- Houve acentuação desse processo no governo Lula e agora no de Dilma Rousseff?
Bermann –
O que acontece a partir de Lula é o que eu tenho chamado de "reprimarização da economia". Nós já tivemos uma época em que a economia dependia basicamente da produção de bens primários: café, açúcar e também alguns bens industriais primários. Depois, tivemos Getúlio Vargas, Juscelino (Kubitschek), e nos anos 50 houve a substituição das importações com a vinda da indústria pesada. Aquele período marca um processo acelerado de industrialização da economia brasileira em que se buscava um desenvolvimento tecnológico para acompanhar o ritmo internacional. Agora, vivemos a reprimarização da economia. E não é uma questão do governo, simplesmente. O governo poderia tornar essa questão pública, dar condições para que a população compreendesse e debatesse o que está em jogo, e isso pudesse servir como base de apoio para uma tomada de decisão do tipo: "Olha, Alcoa (corporação de origem americana com grande presença no Brasil, é a principal produtora mundial de alumínio primário e alumínio industrializado, assim como a maior mineradora de bauxita e refinadora de alumina), vocês não vão continuar aumentando a produção aqui no Brasil. Procurem um outro lugar. A produção de energia elétrica gera um problema ambiental enorme, um problema social enorme, e nós vamos priorizar a demanda da população”. Mas, infelizmente, isso não é feito.

- Mas essa obstinação do governo Lula, e agora do governo Dilma, em fazer Belo Monte, mesmo já tendo um prejuízo de imagem aqui e lá fora, mesmo tendo mais de uma dezena de ações judiciais contra a obra movidas pelo Ministério Público Federal, fora as outras... Essa obstinação se dá apenas por causa do esquema de governabilidade, do esquema político para as eleições a curto e médio prazo, ou é por mais alguma coisa?

Bermann –
Isso já não te parece plausível? Ou você acha que tem alguma coisa meio doentia, que precisa ser explicada? (risos)
- Doentia, não sei. Mas eu gostaria de compreender melhor por que o senhor e a maioria dos especialistas que estudaram o projeto afirmam que esta obra é ruim também do ponto de vista técnico.

Bermann –
Divulgaram que esta será a única usina do Xingu. Inclusive, houve um seminário recente aqui na USP em que tive a oportunidade de discutir com o Mauricio Tolmasquim (presidente da Empresa de Pesquisa Energética, ligada ao Ministério de Minas e Energia). E ele veio com essa ladainha: “Vai ser a única...”. E eu disse a ele: “Com o perdão do poeta, o que você está afirmando, somente de papel passado, com firma em cartório e assinado: Deus”.
- O senhor não acredita que será a única usina do Xingu, então?

Bermann –
Me diga alguma coisa no nosso país que vigorou como cláusula pétrea. Me fale alguma coisa aqui no nosso país que foi dito de uma forma e se manteve ao longo do tempo. VAI ser necessário construir outras usinas. No atual projeto, esta é uma usina que vai funcionar à plena carga, no máximo, quatro meses por ano, por causa do regime hidrológico. Se ela estiver sozinha, o volume de água para rodar as turbinas dependerá da quantidade de chuva. E aquela região tem a seguinte característica: quando chove, quando tem água, quando desce a água dos tributários para o Xingu é muita água, é um volume enorme de água. Mas isso só acontece durante quatro meses por ano. Só nesse período os 11.200 megawatts vão estar operando. Em outubro, na época da estiagem, será apenas 1.100 megawatts, um décimo. Então, a pergunta é: por que construir uma usina desse porte, se, na média anual, ela vai operar com 4.300 megawatts? Necessariamente vão vir as outras quatro. Eu estou afirmando isso, infelizmente. Tecnicamente, eu tenho absoluta certeza. Porque as usinas rio acima vão segurar a água e aí Belo Monte não vai depender da quantidade de chuva. É o único jeito dessa potência instalada de 11.200 megawatts existir de fato.

“O conceito do governo e das empresas não é o de população atingida, mas o de população afogada"
Célio Bermann
- O senhor está dizendo que o governo federal está mentindo ao afirmar que será apenas uma usina, para conseguir vencer as resistências ao projeto e aprová-la, e depois fará mais três ou quatro?
Bermann –
Estou dizendo que, da forma como esta usina está colocada, é uma aberração técnica tão grande que é totalmente ilógico construí-la.
- E essa afirmação, discutida hoje na Justiça, de que os povos indígenas não serão atingidos?
Bermann –
A noção que as empresas e o governo federal têm é a noção de população afogada – e não atingida. 
- Agora, digamos que nós concordássemos que a obstinação de construir Belo Monte, ainda que atropelando a população e talvez a Constituição, se devesse à necessidade de energia elétrica. E digamos que Belo Monte fosse de fato um projeto de engenharia viável e inteligente. As usinas hidrelétricas são as melhores opções para a geração de energia no Brasil de hoje? Quais são as alternativas a elas?

Bermann –
Não podemos olhar a questão da produção de energia sem questionar ou considerar o outro lado, que é o consumo de energia. Parece meio prosaico, porque envolve hábitos culturais da população. E a população sempre entendeu que energia elétrica se resume a você apertar o botão e ter eletricidade disponível. E por isso fica em pânico com a “Síndrome do Blecaute”. Mas é preciso pensar além disso. Não estou dizendo para fechar as fábricas de alumínio, de aço e de celulose no Brasil. O que estou dizendo é o seguinte: parem de ampliar a produção. Parem, porque diversos países desenvolvidos já fizeram isso. O Japão fez mais do que isso. O Japão produzia, em 1980, 1,6 milhões de toneladas de alumínio. Nós estamos produzindo quase 1,7 milhões de toneladas hoje. Só que a energia elétrica necessária para produzir alumínio tornou-se da ordem do absurdo. Então o governo japonês, as empresas japonesas produtoras de alumínio e os trabalhadores da indústria do alumínio realizaram um debate que culminou com o fechamento de todas as usinas de produção de alumínio primário no Japão, exceto uma. Isso ainda nos anos 80. Hoje, o Japão produz apenas 30 mil toneladas. De 1,6 milhões para 30 mil toneladas. Diante da necessidade de gerar muita energia para produzir alumínio, o que o Japão fez? O governo e a sociedade japonesa disseram: “Vamos priorizar a eficiência, o maior valor agregado. Nós não precisamos produzir aqui. Tem o Brasil, tem a Venezuela, tem a Jamaica, tem os lugares para onde a gente pode transferir as plantas industriais e continuar a assegurar o suprimento para a nossa necessidade industrial. A gente pega esse alumínio, agrega valor e exporta na forma de chip. Parece uma coisa tão besta, né? Mas foi isso o que os japoneses fizeram. Eles mantiveram o crescimento econômico e reduziram a demanda por energia. Nós estamos caminhando no sentido inverso. Estamos aumentando o consumo de energia a título de crescimento e desenvolvimento, e, numa atitude absolutamente ilógica, porque a gente exporta hoje a tonelada de alumínio a US$ 1.450, US$ 1.500 dólares. E, para se ter uma ideia, hoje falta esquadrias de alumínio no mercado interno, no mercado de construção brasileiro. O preço foi aumentado por indisponibilidade. Hoje, e fizemos um estudo recente sobre isso, é preciso importar esquadrias de alumínio porque a oferta no mercado interno é insuficiente. E, enquanto o Brasil exporta o alumínio por US$ 1.450, US$ 1.500, o preço da tonelada de esquadria importada é o dobro: cerca de US$ 3 mil a tonelada.

- Para o senhor, a questão de fundo é outra...
Bermann -
Nós temos pouca capacidade de produzir alumínio com valor agregado. Então, não estou dizendo para fechar essas fábricas, botar os trabalhadores na rua, mas dizendo para parar de produzir alumínio primário, que exige uma enorme quantidade de energia, e investir no processo de melhoria da matéria-prima para satisfazer inclusive a demanda interna hoje insatisfeita. Agora, vai perguntar isso para a ABAL (Associação Brasileira de Alumínio). Veja se eles estão pensando dessa forma. Billiton, Alcoa, mesmo o sempre venerado Antônio Ermírio de Moraes, com a Companhia Brasileira de Alumínio. A perspectiva desse pessoal é a cega subordinação ao que define hoje o mercado internacional, o mercado financeiro. E é assim que o nosso país fica desesperado com a ideia de que vai faltar energia. 

Não é Programa Luz para Todos, mas Luz para quase Todos ou Conta de Luz para Todos"
Célio Bermann
- Além de ser um modelo de desenvolvimento que prioriza a exportação de bens primários, sem valor agregado, é também um modelo de desenvolvimento que ignora o esgotamento de recursos. Enquanto tem, explora e lucra. Alguns poucos ganham. O custo socioambiental, agora e no futuro, será dividido por todos...

Bermann –
Isso. Os recursos naturais são limitados. Por isso, no meu ponto de vista, a discussão do aquecimento global obscurece o entendimento da hidroeletricidade em particular. Ficamos às cegas. Para transformar o barro da bauxita naquele pó branco do alumínio, que depois é fundido através de uma corrente elétrica, é uma quantidade de energia enorme, absurda. Essa possibilidade você não vai conseguir com energia solar, com energia eólica. São processos produtivos que exigem a manutenção do suprimento de energia elétrica 24 por 24 horas. A solar não consegue fazer isso na escala necessária. Uma tonelada de alumínio consome 15 a 16 mil kilowatts-hora. Para se ter uma ideia, na média, o consumidor brasileiro consome, por domicílio, 180 kilowatts-hora por mês, o que é baixo. Nós ainda estamos vivendo uma situação muito próxima da miserabilidade em termos energéticos para a população. Nós temos uma demanda a ser satisfeita com equipamentos eletrodomésticos. Satisfeita não construindo grandes usinas hidrelétricas para as empresas eletrointensivas, mas para conseguirmos equilibrar a qualidade de vida, que se deve fundamentalmente a uma herança histórica: a de sermos um dos países com a pior distribuição de renda do mundo. 

- Uma das piores distribuições de renda e uma das piores distribuições de eletricidade do mundo...
Bermann –
Eu chamo o programa de universalização de "Luz para quase todos". Não é para todos, é para quase todos. Desde que estejam próximos da rede para extensão, tudo bem. Mas, para o sujeito distante, só agora é que se começa a pensar em sistemas de produção descentralizada. A percepção ainda é, infelizmente, de pegar e estender a rede. Mas o custo de extensão da rede é muito alto. Principalmente, se você pegar e atravessar 15 quilômetros para atender duas, três casas. O lógico seria a adoção de energia descentralizada em escala menor, que seja mais bem controlada pela população. Mas isso não passa pela cabeça porque define inclusive uma outra relação social. Eu também chamo esse programa de “Conta de luz para todos”, porque de repente você fica refém de uma companhia e necessariamente paga conta de luz, quando você poderia criar uma situação de autonomia energética. 

- O senhor poderia explicar melhor quais são as alternativas para a população, já que todos nós crescemos dentro de uma lógica em que recebemos a conta da luz e pagamos a conta da luz; apertamos um botão na parede e a luz se faz. A realidade está exigindo que sejamos mais criativos e tenhamos mais largura de raciocínio. Quais são as alternativas para o cidadão comum, especialmente o de regiões mais afastadas?

Bermann –
Depende muito do acesso à tecnologia existente no local ou na região. Hoje, por exemplo, temos no Rio Grande do Sul uma experiência de queimar casca de arroz para gerar energia. O calor da queima da casca de arroz aquece a água, a água se transforma em vapor e esse vapor é injetado num tubo e gira uma turbina produzindo energia elétrica. Não tem nada de fantástico nisso, esse processo é conhecido há muito tempo, mas, puxa vida, eu estou tão acostumado a simplesmente acender e apagar o botão... Vou ficar agora me preocupando se tem combustível? Existe um lado meio trágico da população em geral que é o comodismo: deixa que resolvam por mim. Então, quando você me pergunta sobre alternativas, depende do que a gente está falando. Existem alternativas promissoras deixando de produzir mais mercadorias eletrointensivas. Como também é promissor ter esquemas de financiamento para que o pequeno empresário adquira um painel fotovoltaico (placa que transforma luz solar em energia elétrica) ou uma usina de geração eólica (transformação de vento em energia elétrica). E use essa tecnologia que está disponível para satisfazer as suas necessidades, sem necessariamente ficar ligado a uma grande linha de transmissão, de distribuição, puxando energia não sei de onde. 

- O que o senhor diria para a parcela da população brasileira que faz afirmações como estas: "Ah, se não construir Belo Monte não vai ter luz na minha casa", ou "Ah, esses ecochatos que criticam Belo Monte usam Ipad e embarcam em um avião para ir até o Xingu ou para a Europa fazer barulho". O que se diz para essas pessoas para que possam começar a compreender que a questão é um pouco mais complexa do que parece à primeira vista?

Bermann –
Não é verdade que nós estamos à beira de um colapso energético. Não é verdade que nós estamos na iminência de um “apagão”. Nós temos energia suficiente. O que precisamos é priorizar a melhoria da qualidade de vida da população aumentando a disponibilidade de energia para a população. E isso se pode fazer com alternativas locais, mais próximas, não centralizadas, com a alteração dos hábitos de consumo. É importante perder essa referência que hoje nos marca de que esse tipo de obra é extremamente necessário porque vai trazer o progresso e o desenvolvimento do país. Isso é uma falácia. É claro que, se continuar desse jeito, se a previsão de aumento da produção das eletrointensivas se concretizar, vai faltar energia elétrica. Mas, cidadãos, se informem, procurem pressionar para que se abram canais de participação e de processo decisório para definir que país nós queremos. E há os que dizem: “Ah, mas ele está querendo viver à luz de velas...”. Não, eu estou dizendo que a gente pode reduzir o nosso consumo racionalizando a energia que a gente consome; a gente pode reduzir os hábitos de consumo de energia elétrica, proporcionando que mais gente seja atendida, sem construir uma grande, uma enorme usina que vai trazer enormes problemas sociais, econômicos e ambientais. É importante a percepção de que, cada vez que você liga um aparelho elétrico, a televisão, o computador, ou a luz da sua casa, você tenha como referência o fato de que a luz que está chegando ali é resultado de um processo penoso de expulsão de pessoas, do afastamento de uma população da sua base material de vida. E isso é absolutamente condenável, principalmente se forem indígenas e populações tradicionais. Mas também diz respeito à nossa própria vida. É necessário ter uma percepção crítica do nosso modo de vida, que não vai se modificar amanhã, mas ela precisa já estar na cabeça das pessoas, porque não é só energia, é uma série de recursos naturais que a gente simplesmente não considera que estão sendo exauridos e comprometidos. É necessário que desde a escola as crianças tenham essa discussão, incorporem essa discussão ao seu cotidiano. Eu também tenho uma dificuldade muito grande de chegar aqui na minha sala e não ligar logo o computador para ver emails, essas coisas. Confesso que tenho. Mas eu também percebo uma grande satisfação quando eu consigo não fazer isso. E essa percepção da satisfação é uma coisa cultural, pessoal, subjetiva. Mas ela precisa ser percebida pelas pessoas. De que o nosso mundo não existe apenas para nos beneficiarmos com essas "comodidades" que a energia elétrica em particular nos fornece. Agora isso exige um esforço, e a gente vive num mundo em que esse esforço de perceber a vida de outra forma não é incentivado. Por isso é difícil. E por isso, para quem quer construir uma usina, quer se dar bem, quer ganhar voto, quer manter a situação de privilégio, seja local ou nacional, para essas pessoas é muito fácil o convencimento que é praticado com relação a essas obras. Por mais que eu tenha sempre chamado a atenção para o caráter absolutamente ilógico da usina, das questões que envolvem a lógica econômico e financeira dessa hidrelétrica, para o absurdo que é a utilização do dinheiro público para isso, para a referência à necessidade de se precisar, num futuro próximo, enfrentar um ritmo violento de custo de vida, emitindo moeda para sustentar empreendimentos como esse, é muito difícil fazer com que as pessoas compreendam a relação dessa situação com as grandes obras. E Belo Monte é mais um instrumento disso. Eu não sou catastrofista, não tenho a percepção maléfica da hidroeletricidade. Não demonizo a hidroeletricidade. Eu apenas constato que, da forma como ela é concebida, particularmente no nosso país nos últimos anos, é uma das bases da injustiça social e da degradação ambiental. Se não é pensando em você, você necessariamente vai precisar pensar nas gerações futuras. Este é o recado para o leitor: é preciso repensar a relação com a energia e o modelo de desenvolvimento, é preciso mudar o nosso perfil industrial e também é preciso mudar a cultura das pessoas com relação aos hábitos de consumo. Nós precisamos mudar a relação que nos leva a uma cega exaustão de recursos. 

Em Brasília há um vírus letal que se chama ‘Brasilite’. É um verme que entra pelo umbigo e faz com que a pessoa se ache o centro do universo"
Célio Bermann

- O senhor acha que a Dilma tem essa obstinação com Belo Monte, em parte, por teimosia?
Bermann -
Ela é muito cabeça dura. 
- Às vezes eu acho que as questões subjetivas têm um peso maior do que a gente costuma dar. Não sei...

Bermann -
É, mas eu também não sei, não tenho nenhuma proximidade maior com o que ela está pensando agora. O que eu sei é que, no dia a dia, lá no ministério, ela demonstrava uma capacidade muito reduzida de ouvir. Ela pode até ouvir, mas as coisas na cabeça dela já estão postas. 
- Por que o senhor saiu do governo em 2004?

Bermann -
Porque venceu o contrato, e eu achei que não valia a pena continuar. Há conhecidos meus que foram na mesma época que eu e estão até hoje em Brasília. Não estão mais no ministério, mas estão em Brasília. Acho que Brasília é uma cidade com um vírus letal, que é a "Brasilite". A "Brasilite" se compõe de um verme que entra no umbigo e toma a barriga da pessoa de forma a ela achar que é o centro do universo. A partir daí, mudam as relações pessoais, o que a pessoa era e o que ela passa a ser. Eu mesmo perdi muitos amigos que começaram a empinar o queixo. Fazer o quê? E isso faz parte do “modus vivendi” brasiliense. Basta você ter um terno e uma gravata que você é doutor. Eu acho que a gente não vai muito longe alimentando isso. 
- O senhor participou da elaboração do programa de Lula na campanha de 2002 e participou do primeiro ano de governo. Está desiludido?

Bermann –
Eu não aceito quando me definem como: "Ah, você também é daqueles que estão desiludidos, estão chateados...". Tem essa conotação, né? Em absoluto. Eu não estou desiludido, chateado, bronqueado. Eu estou indignado! 
- Quando o senhor se desfiliou do PT?

Bermann –
Ah, quando o bigode do Sarney estava aparecendo muito nas fotos.

Sucateado, Exército não teria como responder a guerra, dizem generais

Série de reportagens do G1 mostra situação de militares e riscos ao país.
Plano para reequipar tropas, assinado por Lula em 2008, pouco avançou.

Assinada em 2008, a Estratégia Nacional de Defesa (END) prevê o reaparelhamento das Forças Armadas do país em busca de desenvolvimento e projeção internacional, mirando a conquista de um assento permanente no Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas (ONU). No entanto, poucas medidas previstas no decreto tiveram avanços desde então.
exercito_infografico_versao13agosto_300 (Foto: Editoria de Arte/G1)
O Exército, que possui o maior efetivo entre as três Forças (são 203,4 mil militares), está em situação de sucateamento. Segundo relato de generais, há munição disponível para cerca de uma hora de guerra.
O G1 publica, ao longo da semana, uma série de reportagens sobre a situação do Exército brasileiro quatro anos após o decreto da END, assinado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Foram ouvidos oficiais e praças das mais diversas patentes - da ativa e da reserva -, além de historiadores, professores e especialistas em segurança e defesa. O balanço mostra o que está previsto e o que já foi feito em relação a fronteiras, defesa cibernética, artilharia antiaérea, proteção da Amazônia, defesa de estruturas estratégicas, ações de segurança pública, desenvolvimento de mísseis, atuação em missões de paz, ações antiterrorismo, entre outros pontos considerados fundamentais pelos militares.

O Exército usa o mesmo fuzil, o FAL, fabricado pela empresa brasileira Imbel, há mais de 45 anos. Por motivos estratégicos, os militares não divulgam o total de fuzis que possuem em seu estoque, mas mais de 120 mil unidades teriam mais de 30 anos de uso.

Carros, barcos e helicópteros são escassos nas bases militares. O índice de obsolescência dos meios de comunicações ultrapassa 92% - sendo que mais de 87% dos equipamentos nem pode mais ser usado, segundo documento do Exército ao qual o G1 teve acesso. Até o início de 2012, as fardas dos soldados recrutas eram importadas da China e desbotavam após poucas lavadas.

A Estratégia Nacional de Defesa elencou entre os pontos-chave a proteção da Amazônia, o controle das fronteiras e o reaparelhamento da tropa, com o objetivo de obter mobilidade e rapidez na resposta a qualquer risco. Defesa cibernética e recuperação da artilharia antiaérea também estão entre os fatores de preocupação.

Um centro de defesa contra ataques virtuais começou a ser instalado pelo Exército em 2010, em Brasília, mas ainda é enxuto e não conseguiu impedir ataques a uma série de páginas do governo durante a Rio+20, em junho deste ano.

O Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras (Sisfron), iniciativa que busca vigiar mais de 17 mil quilômetros de divisas com 10 países, começará a ser implantado ainda em 2012, com um teste na fronteira do Mato Grosso do Sul com Paraguai e Bolívia.

Segundo o general Walmir Almada Schneider Filho, do Estado-Maior do Exército, a Força criou 245 projetos para tentar atingir os objetivos da Estratégia Nacional de Defesa. Ele afirma que os recursos, porém, chegam aos poucos.

exercito_especial_cronograma_dia1 (Foto: Editoria de Arte/G1)
Nos últimos 10 anos, a percentagem do Produto Interno Bruto (PIB) investido em defesa gira em torno de 1,5%, segundo números do Ministério da Defesa - em 2011, o valor foi de R$ 61,787 bilhões. Durante a crise econômica, entre 2003 e 2004, o índice chegou a 1,43%. O maior percentual foi registrado em 2009, quando 1,62% do PIB foram destinados para o setor.
Em 2012, o Exército receberá cerca de R$ 28,018 bilhões, mas 90% serão destinados ao pagamento de pessoal. Desde 2004, varia entre 9% e 10% o montante disponível para custos operacionais e investimentos.

A ideia do ministro da Defesa, Celso Amorim, é elevar gradativamente os gastos com defesa para a média dos demais países dos Brics (Rússia, Índia e China), que é de 2,4%. Segundo afirmou em audiência no Senado, o objetivo é fazer o Brasil ter maior peso no cenário internacional.

“Nós perdemos nossa capacidade operacional, sabemos dessa defasagem. A obsolescência é grande. Por isso, um dos nossos projetos busca a recuperação da capacidade operacional. Até 2015, devemos receber R$ 10 bilhões só para isso”, afirma o general Schneider Filho, responsável pelos estudos da END no Estado-Maior do Exército.
Posso lhe afirmar que possuímos munição para menos de uma hora de combate"
General Maynard Santa Rosa
 
Falta munição
 
Dois generais da alta cúpula, que passaram para a reserva recentemente, afirmaram ao G1 que o Brasil não tem condições de reagir a uma guerra. “Posso lhe afirmar que possuímos munição para menos de uma hora de combate”, diz o general Maynard Marques de Santa Rosa, ex-secretário de Política, Estratégia e Assuntos Internacionais do Ministério da Defesa.

exercito_especial_soldado_barco_300 (Foto: Tahiane Stochero/G1) 
Guerreiro de selva patrulha rio na Amazônia durante
ação militar em 2012 (Foto: Tahiane Stochero/G1)
 
“A quantidade de munição que temos sempre foi a mínima. Ela quase não existe, principalmente para pistolas e fuzis. Nossa artilharia, carros de combate e grande parte do armamento foram comprados nas décadas de 70, 80. Existe uma ideia errada de que não há ameaça. Mas se ela surgir, não vai dar tempo de atingir a capacidade para reagir”, alerta o general Carlos Alberto Pinto Silva, ex-chefe do Comando de Operações Terrestres (Coter), que coordena todas as tropas do país.

“Nos últimos anos, o Exército só tem conseguido adquirir o mínimo de munição para a instrução. Os sistemas de guerra eletrônica (rádio, internet e celular), a artilharia e os blindados são de geração tecnológica superada. Mais de 120 mil fuzis têm mais de 30 anos de uso. Não há recursos de custeio suficientes”, diz Santa Rosa. Ele deixou o Exército em fevereiro de 2010, demitido por Lula após chamar a Comissão da Verdade, que investiga casos de desaparecidos políticos na Ditadura, de “comissão da calúnia”.
Nós perdemos nossa capacidade operacional, sabemos dessa defasagem. A obsolescência é grande".
 
General Walmir Almada Schneider Filho
 
Segundo o Livro Branco, documento que reúne dados sobre a defesa nacional, o Exército possui 71.791 veículos blindados, a maioria deles comprados há mais de 30 anos. Apenas um é do modelo novo, o Guarani, entregue em 2012 e que ainda está em avaliação. Um contrato inicial de R$ 41 milhões foi fechado para a aquisição dos primeiros 16 novos carros de combate. No último dia 7, um novo contrato foi assinado para a aquisição de outras 86 viaturas Guarani, ao custo de R$ 240 milhões.
"Nenhuma nação pode abrir mão de ter um Exército forte, que se prepara intensivamente para algo que espera que nunca ocorra. A população tem que entender que é preciso ter essa capacidade ociosa, sempre, para estar pronto para dar uma resposta se um dia for necessário", defende o general Fernando Vasconcellos Pereira, diretor do Departamento de Educação e Cultura do Exército.

Riscos e ameaças
 
Para saber quais equipamentos, tecnologias e armas precisam ser compradas e que outras mudanças são necessárias, o Exército criou o Grupo Lins, que reúne uma equipe para prever cenários de conflitos ou crises - internos ou externos - em que a sociedade e os políticos possam exigir a atuação dos militares até 2030.

O objetivo é antever problemas, sejam econômicos, sociais, de segurança pública ou de calamidade, e saber quais treinamentos devem ser dados aos soldados até lá.
soldados_treinamento_engatinham_300 (Foto: Tahiane Stochero/G1) 
 Soldados recrutas fazem teste de resistência em
treinamento no Exército (Foto: Exército/Divulgação)
 
Nesses cenários, a Amazônia e as fronteiras estão entre as maiores preocupações. O texto revisado da Estratégia Nacional de Defesa, entregue pelo governo ao Congresso Nacional em 17 de julho, destaca "a ameaça de forças militares muito superiores na região amazônica”.
Difícil – e necessário – é para um país que pouco trato teve com guerras convencer-se da necessidade de defender-se para poder construir-se".
 
Trecho da Estratégia Nacional de Defesa
 
Para impedir qualquer ataque, o Exército prepara o Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras (Sisfron), que, através de um conjunto de sensores, radares e câmeras, permitirá a visualização de tudo o que ocorre nas fronteiras em tempo real. Os equipamentos facilitarão a repressão ao tráfico de drogas e armas, ao contrabando e aos crimes ambientais. A previsão é de que o sistema esteja totalmente operando em 2024.
O alto valor que o governo pretende passar para o Sisfron - R$ 12 bilhões até 2030 – movimentou o mercado nacional e fez com que empresas se unissem buscando soluções para vencer a licitação em andamento. Entre as interessadas estão Odebrecht, Andrade Gutierrez e Embraer, que fizeram parcerias com grandes indústrias do setor.
Para o historiador e criador do Núcleo de Estudos Estratégicos da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Geraldo Cavanhari, o Exército está em transformação e precisa se adequar para os inimigos do futuro. “O inimigo, seja interno ou externo, agora está extremamente bem armado. Por enquanto, não temos ameaças explícitas, mas temos que cuidar da nossa casa e estar preparados para responder, caso seja necessário”.
O general da reserva Carlos Alberto Pinto Silva diz que o problema continua sendo o orçamento. "Um coronel argentino me disse que eles aprenderam na guerra nas Malvinas que, se não existe a capacidade mínima de responder, não dá tempo para adquirir. Não adianta chorar depois”, afirma.

Mudança de percepção
 
Estudioso da área, o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Ronaldo Fiani entende que a abertura democrática e a criação do Mercosul provocaram mudanças na forma da população conceber a proteção do país, Consequentemente, foram feitos cortes nos investimentos militares. “O fim da ditadura e a união dos países latinos fez com que houvesse enfoque em integração, com diminuição do investimento na área militar", explica.

Burocracia, crises financeiras e déficit fiscal também são entraves para maior disponibilidade de recursos. “A única forma dos militares receberem mais investimentos é se integrando à pesquisa acadêmica e às empresas, como ocorre nos países desenvolvidos", diz Fiani.

exercito_especial_general_indios_para_300 (Foto: Tahiane Stochero/G1) 
General José Carlos de Nardi cumprimenta índios
durante visita ao Pará  (Foto: Tahiane Stochero/G1)
 
O general Walmir Almada Schneider Filho concorda com o professor. “No primeiro mundo, o povo tem a mentalidade de que defesa e desenvolvimento caminham juntos e complementam-se. Um impulsiona o outro. Nós não queremos chegar neste patamar [de país voltado para a guerra], mas criar uma mentalidade de defesa, para que o povo discuta o assunto", diz.
A base da defesa nacional é a identificação da Nação com as Forças Armadas e das Forças Armadas com a Nação. Isso exige que a Nação compreenda serem inseparáveis as causas do desenvolvimento e da defesa".
 
Trecho da Estratégia Nacional de Defesa
“Eu acho que a redução dos investimentos tem relação com o período militar e a própria mentalidade da população, que vê como melhor alternativa aplicar os recursos em outro setor fundamental, como saúde, educação, etc", acrescenta Schneider Filho.

"Não há um palmo sobre o território brasileiro que não esteja sob a responsabilidade de uma tropa do Exército. Somos a organização mais presente em todo o território e que tem meios de chegar o quanto antes em qualquer situação. Por isso, assumimos cada vez mais responsabilidades e temos que ter capacidade para atuar em situações de emergência”, diz o general José Fernando Yasbech, também do Estado-Maior do Exército.


Yasbech se refere aos múltiplos empregos do Exército em ações civis dentro do país, como as operações de Garantia da Lei e da Ordem (GLO), como a Constituição determina o emprego militar em casos graves de segurança pública. Além disso, o militares são convocados para o apoio em caso de enchentes, abertura de estradas, construção de pontes, distribuição de ajuda humanitária, apoio em eleições, combate à dengue e à aftosa, entre outros.
Proteger
Em 2012, mais uma linha de atuação está sendo aberta: os militares serão responsáveis pela defesa e proteção de infraestruturas estratégicas do país, como hidrelétricas, usinas nucleares, indústrias essenciais e centros financeiros e de telecomunicações a partir da criação do projeto Proteger. O programa terá recursos na casa dos R$ 9,6 bilhões e reunirá órgãos públicos dos estados e informações necessárias para prevenir, conter ou reprimir ataques ou acidentes nesses locais.

Se o Brasil quiser ocupar o lugar que lhe cabe no mundo, precisará estar preparado para defender-se não somente das agressões, mas também das ameaças"
Trecho da Estratégia Nacional de Defesa
São mais de seis mil infraestruturas estratégicas existentes no país, sendo que 364 estão entre as mais críticas, conforme levantamento do Gabinete de Segurança Institucional (GSI) da Presidência da República.
exercito_especial_cabana_cancela_300 (Foto: Tahiane Stochero/G1) 
Pelotão de fronteira no Pará conta com apenas 9
horas diárias de luz (Foto: Tahiane Stochero/G1)
 
"O trabalho será tanto no sentido de prevenir acidentes nessas estruturas como também de identificar riscos e, eventualmente, contê-los", diz o general José Fernando Yasbech, que responde pelo projeto.
O trabalho começará no Paraná, com a implementação de um centro de ação conjunta com polícia, Bombeiros e Defesa Civil para defender a Usina de Itaipu.

“O reaparelhamento das Forças Armadas vai além de apenas dizer que um país pacifista está tomando uma atitude de se tornar mais bélico. O emprego dos militares tem sido bem diferente nos últimos anos, seja em ações de defesa civil, de segurança pública, de apoio aos órgãos estaduais. E isso demanda alterações estruturais profundas na política, na mentalidade da população e em investimentos”, diz Iberê Pinheiro Filho, mestre em Relações Internacionais e estudioso da Estratégia Nacional de Defesa.

Procurado para comentar a atual situação do Exército, o ex-ministro de Assuntos Estratégicos Roberto Mangabeira Unger, que escreveu o texto da Estratégia Nacional de Defesa, disse que se considerava "moralmente impedido de falar" devido à "relação íntima e especial com as ações e tarefas de que tratará a reportagem".

"Direi apenas o que escrevi na dedicatória de um livro que dei à biblioteca do Exército, por mãos do general que a comanda: o Exército brasileiro é a mais importante instituição do Brasil", afirmou Mangabeira Unger ao G1.

Já o ex-ministro da Defesa Nelson Jobim, que também assinou a END em 2008, disse que não iria comentar a situação, pois não ocupa mais o cargo.
exercito_especial_tenente_costas_barcos_620 (Foto: Tahiane Stochero/G1)Tenente caminha entre barcos antigos usados para deslocamento em rios do AP (Foto: Tahiane Stochero/G1)

Parauapebas: política na esquina, notícias e boatos do dia

A mais nova é que o candidato ZACARIAS, aquele que na eleição passada teve o registro indeferido e os votos foram nulos, fez uma pesquisa entre os eleitores deles, pois não é que no meio dos eleitores dele o VALMIR ganhou e com folga, ele tá na esperança do empate técnico na sua coordenação de campanha///// Também, parece que o PP fechou apoio ao VALMIR, tá tudo AZUL///// Os vereadores do PP não queriam por a propaganda do COUTINHO no material de campanha do partido, dizem que não querem subir ladeira carregando pedra, mas puseram na marra///// No PP o DARCI foi expurgado, ninguém sabe, ninguém viu, ninguém dá  notícias, no PT também///// A última é que a orla, aquela que o DARCI disse que era prioridade, agora foi para segundo plano, tão dizendo que a meta agora é o metrô, pois é, DARCI falou por aí que o seu candidato vai fazer um metrô em Parauapebas, não ria que a coisa é séria///// Tão dizendo que o reforço da campanha do COUTINHO tá chegando, segredo total, mas o Sol do Carajás vai adiantar: ANA JÚLIA vem aí! Os petistas estão em estado de prontidão, não vêem a hora da ex-governadora entrar pra valer na campanha, claro, junto com DARCI/////
 
Fonte: Blog Sol do Carajás.

segunda-feira, agosto 13, 2012

UM BELO TEXTO PARA A NAÇÃO REFLETIR

Atílio Alencar e Carlos Henrique, dois dos agentes culturais mais hard que eu conheço nesse Brasil; admiro-os muito, mas dizer que o Mensalão é fantasioso é realmente passar recibo de ingênuo (no mínimo), companheiros.
 
O PT promoveu grandes mudanças e enormes avanços na área cultural, sim... mas isso não me torna cego à pandemônia que foi criada nesses 8 anos de Governo Lula, o tal que nada sabia, nada ouvia e nada via. 
 
O Mensalão existiu, há farto material comprobatório, e vcs dizerem que a mídia fabricou esse material, é quase irresponsável, pois é essa mesma mídia que agora, a serviço deste desgoverno Dilma, por exemplo, insiste em manter-se em silêncio sobre a situação das universidades públicas, quase todas paralisadas pelo país inteiro. 
 
Parafraseando o Lula, pai do gênio das finanças que em menos de 10 anos saiu de vigia de zoológico a sócio de multinacionais de telefonia, Nunca antes na história desse país, se viu tamanho caso de corrupção. 
 
Corrupção com o propósito único de perpetuar no poder, uma corja que não teve e não tem pena de assaltar os cofres públicos.

domingo, agosto 12, 2012

Primeiro casal homossexual a adotar criança no país fala sobre Dia dos Pais

Casal entrou na Justiça para conseguir a guarda legal da Theodora.
No Dia dos Pais, menina tem de fazer dois presentes para os pais.

Dorival, Theodora e Vasco comemoram a nova família (Foto: Arquivo Pessoal) 
Dorival, Theodora e Vasco comemoram a
nova família (Foto: Arquivo Pessoal)
 
Todo o Dia dos Pais é uma data que se comemora em dobro para a pequena Theodora Carvalho da Gama, de 11 anos, que mora em Catanduva (SP). Primeira criança adotada legalmente por um casal homossexual masculino no Brasil, a criança tem neste segundo domingo de agosto uma data especial, em que se comemora o fato de ser uma das poucas meninas criadas por dois pais no Brasil.

Mais do que Theodora, quem comemora muito este dia é o casal Dorival Pereira de Carvalho Júnior e Vasco Pedro da Gama Filho. Eles, que estão juntos há mais de 20 anos, brigaram até o fim na Justiça para conseguir a guarda legal da menina. “Esperamos bastante para conseguir a adoção, para que tudo desse certo. Então o Dia dos Pais é uma data muito bonita e importante para nós, representa a realização de um sonho”, afirma Vasco.

A adoção de Theodora foi no final de 2005. Na época a menina tinha 4 anos. Ela não tem o sobrenome da mãe na certidão, mas de dois pais. Quanto a decisão do Supremo, o casal diz que é fantástico e que a mentalidade do brasileiro está mudando. Disse ainda que uma nova família surgiu. “Ficamos quase seis anos na luta para adotar. O juiz não autorizou na primeira vez. Depois entramos com o pedido novamente e embasado na área psicossocial o juiz foi favorável. Agora aproveitamos o Dia dos Pais para nós divertir e curtir a nossa família”, diz Vasco.
O Dia dos Pais é uma data importante para nós, representa a realização de um sonho"
Vasco Pedro da Gama Filho, pai
 
Para não ter ciúmes no Dia dos Pais, na escola Theodora sempre faz dois presentes, um para cada pai. No Dia das Mães quem ganha atenção e carinho são as tias do casal. “Até na escola ela já aprende que no Dia dos Pais ela tem de fazer duas lembranças. Se ela der presente para um pai só, sai briga”, brinca Vasco.

Passado toda a “guerra” para conseguir a adoção, o casal afirma que o resto foi fácil. Mesmo sendo pais de primeira viagem, eles afirmam que não tiveram dificuldade para cuidar da menina. “Não tivemos problemas, mas sempre tinha aquele medo de saber se estamos fazendo a coisa certa na hora de educar ou cuidar dela. Mas nós dois tivemos uma boa educação e nossas famílias também ajudam na hora de cuidar”, explica Vasco, que é cabeleireiro.

Theodora surgiu na vida deles em uma visita a uma instituição de crianças carentes do município. "Eu me apaixonei por ela ali. Eu bati uma foto dela escondido e cheguei em casa falando para o Júnior que tinha uma menina que era a nossa cara”, conta.

Na escola, o preconceito passa longe de Theodora. Na verdade, os amigos até ficam com inveja dela por ter dois pais. “Eu tenho orgulho deles. Acho bacana ter uma família diferente. Gosto muito de beijar, abraçar e andar de bicicleta com eles. Eu e o Vasco fazemos a maior festa. Os meus amigos falam que também queriam ter dois pais ”, diz a menina.

Em Catanduva, o casal também não sofreu com o preconceito por tentar adotar uma criança. Na verdade, eles tiveram apoio da maioria dos moradores. “A cidade abraçou a causa. Todas as idades, de todos os sexos, adolescentes, senhoras. Todos nos cumprimentaram pela ação”, diz.
Depois de brigar na justiça por tanto tempo e enfrentar o preconceito por parte da sociedade, o maior presente do Dia dos Pais, para Vasco e Dorival, é a pequena Theodora.
Theodora afirma que amigos da escola também queriam ter dois pais (Foto: Arquivo Pessoal)Theodora afirma que amigos da escola também queriam ter dois pais (Foto: Arquivo Pessoal)

sábado, agosto 11, 2012

Dia Internacional dos Povos Indígenas

Hoje, 9 de agosto, comemora-se, em todo o mundo, o Dia Internacional dos Povos Indígenas. A data foi instituída pela Organização das Nações Unidas (ONU), em 1995, por meio de decreto, após uma série de reuniões, em Genebra, sede da ONU, onde grupos indígenas, marginalizados à época, se reuniam buscando garantir suas condições de vida e seus direitos humanos. O movimento resultou na criação da Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, aprovada da 107ª Reunião Sessão Plenária de 13 de setembro de 2007.

“A Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas estabelece uma referência para os governos usarem a fim de fortalecerem relações com povos indígenas e protegerem seus direitos humanos. Desde então, vimos mais governos trabalhando para reparar injustiças econômicas e sociais, através de legislação e por outros meios, e assuntos relacionados às populações indígenas tornaram-se mais proeminentes do que nunca na agenda internacional”, declarou o secretário-Geral da ONU, Ban Ki-Moon.
 
Segundo ele, o tema escolhido pela ONU para o Dia Internacional dos Povos Indígenas deste ano é Cineastas Indígenas. “Esses cineastas nos abrem janelas para suas comunidades, culturas e história e seus trabalhos nos conectam a sistemas de fé e filosofias e capturam tanto a rotina diária quanto o espírito das comunidades indígenas”, justificou o secretário-Geral da ONU.

 “Enquanto comemoramos essas contribuições, convoco os governos e a sociedade civil a cumprirem suas promessas de avançar a situação das populações indígenas em todo o mundo”, conclamou Ban Ki-Moon.

Em mensagem divulgada hoje a diretora-geral da Unesco, Irina Bokova lembrou que “em uma época aberta ao debate sobre uma nova agenda de sustentabilidade global, é preciso ouvir as vozes dos povos indígenas. É preciso levar em conta seus direitos, culturas e sistemas de conhecimento”.

Bokova destacou que os povos indígenas representam 370 milhões de pessoas vivendo em quase 90 países. “Eles são guardiões de uma grande riqueza de idiomas e tradições. São portadores de experiência singular em combinar diversidade cultural e biológica de maneira sustentável. Têm acesso às mais profundas fontes de sabedoria e criatividade.

A diretora-geral da Unesco defendeu ainda a inclusão dos povos indígenas no desenvolvimento sutentável. “Os povos indígenas também enfrentam as duras arestas da mudança, desde a pobreza e a injustiça social até a discriminação e a marginalização. Tal situação é insustentável. Para que seja bem-sucedido, o desenvolvimento sustentável deve ser inclusivo. Todas as vozes precisam ser não apenas ouvidas, mas também atendidas”.

No Brasil, o gerente do Memorial dos Povos Indígenas e membro da Comissão Brasileira de Justiça e Paz da Cátedra Indígena Internacional, Marcos Terena, lembra que “situações de dominação devem despertar nossa revolta e nossa indignação”. “Mais do que nunca nós, como parte do movimento indígena, devemos relembrar as conquistas indígenas e, a cada 9 de agosto, jamais permitir que o homem branco continue falando por nós, tomando nossas ideias e mantendo uma postura de “grande pai”. Esse tempo já acabou, mas compete a nós indígenas, fomentar, divulgar e fiscalizar essas ações racistas e preconceituosas”,  protesta Terena.

Políticas Culturais 

Desde 2004 que o Ministério da Cultura tem trabalhado com lideranças das várias comunidades indígenas existentes no país, cuja população é de aproximadamente 817 mil pessoas, segundo censo do Instituto Brasileiro de Estatística (IBGE) de 2012. Essa população está organizada em 270 etnias falantes de 180 línguas indígenas distintas.

Também em 2004 foi criado, no âmbito do Ministério da Cultura, um Grupo de Trabalho. O GT, formado por integrantes de associações dos povos indígenas brasileiros, de representantes das universidades e do próprio MinC teve como objetivo ajudar na elaboração de políticas públicas para o segmento. E em 2010,durante a II Conferência Nacional de Cultura, foram eleitos os primeiros representantes indígenas do Colegiado de Culturas Indígenas.

Os projetos e ações fomentadas pelo MinC, por meio da Secretaria da Cidadania e da Diversidade Cultural (SCDC), fazem parte do escopo do Plano Setorial para as Culturas Indígenas (PSCI), criado em 2010 e vinculado ao Plano Nacional de Cultura (PNC). O Plano prevê o desenvolvimento de ações voltadas para a proteção, a promoção e o fortalecimento e a valorização das culturas indígenas.

Dentre as ações e projetos desenvolvidos pelo Ministério da Cultura, a partir de 2005, estão os Pontos de Cultura Indígenas, fomentados pelo Programa Cultura Viva, por meio de editais. De 2005 até 2007, foram conveniados com o Ministério da Cultura 23 Pontos de Cultura Indígenas. E, em 2010, teve início o processo de implantação de mais 30 Pontos de Cultura. Atualmente, existem, aproximadamente, 105 Pontos de Cultura Indígenas implantados ou em fase de implantação em todo o país. Ainda em 2012, a SCDC lançará nova Chamada Pública para a seleção de mais 46 Pontos voltados para o fomento da cultura do segmento.
 
Em 2007, o MinC abriu o primeiro edital voltado para a premiação de iniciativas culturais realizadas pelos povos indígenas. Até 2010, foram realizados três editais com um total de R$ 2,1 milhões pagos a 92 iniciativas premiadas.

Quarup

No Brasil, uma das maiores festas em homenagem aos povos indígenas reúne, todos os anos no Xingu, vários povos indígenas para a cerimônia do Quarup. A cerimônia, um ritual de homenagem aos mortos ilustres celebrado pelos povos indígenas da região do Xingu no Brasil, é realizada sempre em homenagem a uma figura ilustre, seja por sua linhagem seja por sua liderança, e é uma grande honra prestada a esta pessoa, colocando-a no mesmo nível dos ancestrais e incorporando-a à história mítica.

Neste ano, a cerimônia do Quarup, homenageará o antropólogo e educador Darcy Ribeiro. O evento acontecerá nos dias 18 e 19, na aldeia Yawalapati, e contará com as presenças da ministra da Cultura, Ana de Hollanda e da secretária da Cidadania e da Diversidade Cultural do MinC, Márcia Rollemberg.

(Redação: Heli Espíndola, Comunicação/SCDC)
(Fotos: Acervo SCDC)

VAMOS APRENDER ESSA REGRA DE UMA VEZ POR TODAS.


EXISTEM PESSOAS ASSIM, COMO O AUTOR DESSE PLEITO, EM NOSSAS INSTITUIÇOES.

FALA SERIO!!!!!! ......


"Você" ou "Doutor"? Ou seria Vossa Excelência?



UMA VERDADEIRA AULA DE DIREITO E DE PORTUGUÊS!

LEMBRAM DO JUIZ QUE ENTROU NA JUSTIÇA CONTRA O CONDOMÍNIO EM QUE MORA, POR CAUSA DO TRATAMENTO DE "'VOCÊ" DADO PELO PORTEIRO? POIS É, SAIU A SENTENÇA.

LEIAM ABAIXO. OBSERVEM A BELA REDAÇÃO, SUCINTA, BEM ARGUMENTADA, ATÉ SOLIDÁRIA COM O JUIZ QUE SE QUEIXA, MAS...

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

COMARCA DE NITERÓI

NONA VARA CÍVEL

Processo n° 2005.002.003424- 4

S E N T E N Ç A

Cuidam-se os autos de ação de obrigação de fazer manejada por ANTONIO MARREIROS DA SILVA MELO NETO contra o CONDOMÍNIO DO EDIFÍCIO LUÍZA VILLAGE e JEANETTE GRANATO, alegando o autor fatos precedentes ocorridos no interior do prédio que o levaram a pedir que fosse tratado formalmente de "senhor". Disse o requerente que sofreu danos, e que esperava a procedência do pedido inicial para dar a ele autor e suas visitas o tratamento de ' Doutor, senhor" "Doutora, senhora", sob pena de multa diária a ser fixada judicialmente, bem como requereu a condenação dos réus em dano moral não inferior a 100 salários mínimos. (...)

DECIDO: "O problema do fundamento de um direito apresenta-se diferentemente conforme se trate de buscar o fundamento de um direito que se tem ou de um direito que se gostaria de ter." (Noberto Bobbio, in "A Era dos D ireitos", Editora Campus, pg. 15).


Trata-se o autor de Juiz digno, merecendo todo o respeito deste sentenciante e de todas as demais pessoas da sociedade, não se justificando tamanha publicidade que tomou este processo. Agiu o requerente como jurisdicionado, na crença de seu direito. Plausível sua conduta, na medida em que atribuiu ao Estado a solução do conflito.

Não deseja o ilustre Juiz tola bajulice, nem esta ação pode ter conotação de incompreensível futilidade. O cerne do inconformismo é de cunho eminentemente subjetivo, e ninguém, a não ser o próprio autor, sente tal dor, e este sentenciante bem compreende o que tanto incomoda o probo Requerente.

Está claro que não quer, nem nunca quis o autor, impor medo de autoridade, ou que lhe dediquem cumprimento laudatório, posto que é homem de notada grandeza e virtude. Entretanto, entendo que não lhe assiste razão jurídica na pretensão deduzida.

"Doutor" não é forma de tratamento, e sim título acadêmico utilizado apenas quando se apresenta tese a uma banca e esta a julga merecedora de um doutoramento. Emprega-se apenas às pessoas que tenham tal grau, e mesmo assim no meio universitário. Constitui-se mera tradição referir-se a outras pessoas de 'doutor', sem o ser, e fora do meio acadêmico.

Daí a expressão doutor honoris causa - para a honra -, que se trata de título conferido por uma universidade à guisa de homenagem a determinada pessoa, sem submetê-la a exame.

Por outro lado, vale lembrar que "professor" e "mestre" são títulos exclusivos dos que se dedicam ao magistério, após concluído o curso de mestrado. Embora a expressão "senhor" confira a desejada formalidade às comunicações - não é pronome -, e possa até o autor aspirar distanciamento em relação a qualquer pessoa, afastando intimidades, não existe regra legal que imponha obrigação ao empregado do condomínio a ele assim se referir.

O empregado que se refere ao autor por "você", pode estar sendo cortês, posto que "você" não é pronome depreciativo. Isso é formalidade, decorrente do estilo de fala, sem quebra de hierarquia ou incidência de insubordinação. Fala-se segundo sua classe social. O brasileiro tem tendência na variedade coloquial relaxada, em especial a classe "semi-culta", que sequer se importa com isso.

Na verdade "você" é variante - contração da alocução - do tratamento respeitoso "Vossa Mercê". A professora de linguística Eliana Pitombo Teixeira ensina que os textos literários que apresentam altas freqüências do pronome "você", devem ser classificados como formais. Em qualquer lugar desse país, é usual as pessoas serem chamadas de "seu" ou "dona", e isso é tratamento formal.

Em recente pesquisa universitária, constatou-se que o simples uso do nome da pessoa substitui o senhor/a senhora e você quando usados como prenome, isso porque soa como pejorativo tratamento diferente.

Na edição promovida por Jorge Amado "Crônica de Viver Baiano Seiscentista", nos poemas de Gregório de Matos, destacou o escritor que Miércio Táti anotara que "você" é tratamento cerimonioso. (Rio de Janeiro/São Paulo, Record, 1999).

Urge ressaltar que tratamento cerimonioso é reservado a círculos fechados da diplomacia, clero, governo, judiciário e meio acadêmico, como já se disse. A própria Presidência da República fez publicar Manual de Redação instituindo o protocolo interno entre os demais Poderes. Mas na relação social não há ritual litúrgico a ser obedecido. Por isso que se diz que a alternância de "você" e "senhor" traduz-se numa questão sociolingüística, de difícil equação num país como o Brasil de várias influências regionais.

Ao Judiciário não compete decidir sobre a relação de educação, etiqueta, cortesia ou coisas do gênero, a ser estabelecida entre o empregado do condomínio e o condômino, posto que isso é tema interna corpore daquela própria comunidade.

Isto posto, por estar convicto de que inexiste direito a ser agasalhado, mesmo que lamentando o incômodo pessoal experimentado pelo ilustre autor, julgo improcedente o pedido inicial, condenando o postulante no pagamento de custas e honorários de 10% sobre o valor da causa. P.R.I. Niterói, 2 de maio de 2005.

ALEXANDRE EDUARDO SCISINIO

Juiz de Direito


NESTE PAÍS AINDA EXISTEM JURISTAS HONRADOS E CULTOS!

Nem tudo esta perdido... Aleluia!!!!!

Obs. COLABORAÇÃO DA ACADÊMICA DE DIREITO MICHELINE DINIZ BARRETO
 

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