Em depoimento como testemunha de defesa do ex-governador Sérgio Cabral, ex-presidente negou 'trapaça', falou em 'denuncismo' e brincou com juiz Marcelo Bretas em audiência.
Por Alba Valéria Mendonça, Bárbara Carvalho e Gabriel Barreira, G1 Rio e TV Globo-
Com a mesma gravata colorida com as cores do Brasil utilizada quando o
país foi escolhido sede da Olimpíada de 2016, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva falou pela primeira vez desde que foi preso em Curitiba.
De lá, por videoconferência, ele prestou depoimento como testemunha de defesa do ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral, em ação penal que apura suposta compra de votos da Olimpíada Rio 2016.
Resumo:
- Lula negou saber de 'negociata' para trazer a Olimpíada ao Rio.
- Disse que pediu apoio a países africanos, mas que não havia acordo
- E defendeu o ex-presidente do COB Carlos Arthur Nuzman
- Antes, Cabral prestou solidariedade a Lula pela morte de Dona Marisa
A fala do ex-presidente durou cerca de 50 minutos. Especificamente sobre a denúncia, Lula minimizou.
"Eu
não sei qual é o critério para alguém que diz que foi trapaça (a
escolha da Rio-2016).
O juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal, pediu que o
ex-presidente falasse exclusivamente sobre as perguntas.
Enquanto falava
sobre a denúncia contra o ex-governador, foi interrompido quando citou
"denuncismo".
"Nunca soube de nenhuma negociata, em nenhum momento.
Inclusive assinei um decreto em 2009 que coagia transparência de todos os dados.
Lamento muito que tenha surgido essa denúncia 8 anos depois."
"Não tem troca. Brasil apoiar África era uma coisa natural.
Viajei 34
vezes para África, abri 19 embaixadas na África.
Isso dava aos africanos
quase uma irmandade com o Brasil.
Eu brigava para que continentes
pobres tivessem direito de realizar Olimpíada", garantiu.
De acordo com o Ministério Público Federal, teriam sido comprado votos
de membros africanos do Comitê Olímpico Internacional.
Um empresário
ligado a Cabral teria pago R$ 2 milhões, com a promessa de ganhar
contratos públicos - parte deles desviados para os bolsos do
ex-governador.
Cabral nega toda a denúncia.
Lula também defendeu o ex-presidente do Comitê Olímpico Brasileiro
Carlos Arthur Nuzman: "A atitude dele sempre foi de muito compromisso
com as Olimpíadas e com o Brasil.
Não vi nenhuma atitude dele que
pudesse desabonar o Brasil ou as Olimpíadas".
Cabral presta condolências a Lula pela morte de D. Marisa
Antes das perguntas da defesa, Cabral se emocionou.
Ele pediu para
falar diretamente ao ex-presidente e dedicou condolências pela morte da ex-primeira dama, ocorrida em fevereiro de 2017, quando o ex-governador já estava preso.
"Estava preso quando Dona Marisa faleceu.
Então, a transmissão dos meus
sentimentos.
Meu abraço ao senhor pelo falecimento da Dona Marisa.
[O
abraço] da Adriana [Ancelmo, ex-primeira dama do estado], meu e dos meus
filhos".
Ao final, houve também espaço para o humor.
O juiz encerrou o
depoimento dizendo que valorizava a importância histórica de Lula e
lembrou as Diretas Já.
Até que o ex-presidente o convidou para um
comício.
"Senhor Luiz Inácio, muito obrigado. Inclusive pela postura que se
portou.
O senhor é uma figura importante no nosso país, é relevante sua
história para todos nós. Para mim, inclusive.
Aos 18 anos estava aqui
num comício na Avenida Presidente Vargas com um milhão de pessoas e eu
estava lá usando o boné e a camiseta com seu nome", dizia o magistrado
quando foi interrompido.
"Pode usar agora (o boné e a camisa)", rebateu Lula em alusão a sua
pré-candidatura apesar da prisão.
E completou. "Quando eu fizer um
comício agora vou chamar o senhor para participar".
Lula nega Cabral candidato à presidência
O ex-presidente disse desconhecer a intenção de aproveitar a Rio-2016 para lançar Cabral candidato.
A operação sobre a qual Lula depõe investiga a suposta compra de votos
para a cidade sediar os Jogos Olímpicos.
Segundo o Ministério Público
Federal (MPF), o esquema de corrupção montado pelo ex-governador Sérgio
Cabral teria "comprado" votos de dirigentes do Comitê Olímpico
Internacional (COI).
Assim que começou a prestar depoimento, o ex-presidente garantiu que
"anda em busca da verdade".
"Meu compromisso é com a verdade.
Acredito
que não haja um brasileiro que esteja mais em busca da verdade do que
eu.
Estou cansado de mentiras".
De terno e gravata, Lula já estava a postos às 10h15, aguardando a
entrada de Cabral na sala, quando perguntou se o juiz era Marcelo
Bretas.
O que resultou numa brincadeira do juiz da 7ª Vara Criminal.
"Não fala mal de mim não que estou ouvindo".
E Lula respondeu: "Eu sei,
estou vendo o microfone aqui na minha frente".
Além de Lula, Pelé
também deve prestar depoimento a pedido de Carlos Arthur Nuzman.
Ainda
segundo as investigações do MPF, foram encontrados indícios de que
Nuzman teve participação na negociação.
O ex-dirigente chegou a ser
preso, mas foi solto após decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ).
Os procuradores afirmam que um dos votos comprados foi o de Lamine
Diack, então presidente da Federação Internacional de Atletismo e,
naquele momento, membro do COI.
O dinheiro teria sido entregue ao filho
dele, Papa Massata Diack. Lamine Diack, segundo o MPF, pode ter
repassado parte dos valores para comprar mais votos.
Compra de votos da Rio 2016
O pagamento aos membros do COI teria sido feito pelo empresário Arthur
Soares, também conhecido como Rei Arthur, que está foragido. Soares
tinha negócios de R$ 3 bilhões com o Estado do Rio e era próximo ao
ex-governador.
Já Cabral teria se beneficiado de contratos firmados para as obras
olímpicas.
O MPF sustenta que o ex-governador pedia 5% de propina sobre o
valor de todas as obras.
Cabral nega as acusações e afirma que jamais recebeu propina.
Sobre a
suposta compra de votos, o ex-governador considera um "acinte" da
vitória "consagradora" do Rio.
"O RJ foi eleito com uma diferença de 40 votos com relação à 2ª
candidata, Madri.
Pela versão do MPF seriam todos corruptos.
Não tenho
dúvidas de que em pouco tempo conseguiremos desmontar essa
invencionice", disse à época.
Nenhum comentário:
Postar um comentário