BRASÍLIA - Quase 40% dos deputados federais campeões de votos e dos
senadores eleitos no último domingo são investigados em procedimentos na
Justiça a partir de acusações da polícia e do Ministério Público (MP), com
suspeitas que vão de desvios de recursos e improbidade administrativa a crime
de tortura e desrespeito à Lei Seca.
Levantamento do GLOBO revela que 40 dos
108 parlamentares mais votados são acusados de diferentes crimes em instâncias
judiciais.
Boa parte deles é de novatos que, a despeito do sucesso nas urnas,
já chegam ao Congresso com a possibilidade de serem investigados pelo Supremo
Tribunal Federal (STF), para onde são transferidos os processos e inquéritos de
autoridades com foro privilegiado - benefício assegurado a partir da posse, em
fevereiro de 2015.
O levantamento levou em conta os três deputados federais mais votados em
cada estado e o senador que conquistou a vaga disputada nesta eleição.
Aparecem
na lista dos processados ex-ministros, ex-governadores e ex-prefeitos.
Há ainda
parentes de políticos e neófitos que já chegam ao parlamento com explicações a
dar.
A acusação mais comum é de improbidade administrativa, quando ações
tomadas em cargos públicos são questionadas.
A nova bancada da bala, reforçada por campeões de votos que fazem
propostas de apelo eleitoral, como a redução da maioridade penal, tem diversos
problemas com a Justiça.
Os três deputados mais votados no Pará, em Goiás e no
Distrito Federal são policiais e assumirão seus mandatos na Câmara tendo de
esclarecer acusações do MP.
O delegado Eder Mauro (PSD-PA) foi denunciado por
crime de tortura, envolvendo pai e filha - uma criança de dez anos - como
supostas vítimas.
A Justiça entendeu que a criança sofreu ameaça e, diante da
prescrição, a acusação referente a ela acabou arquivada.
A denúncia relacionada
ao adulto continua sob investigação.
A assessoria do PSD na Câmara informou que
o delegado está em viagem e não foi localizado.
Delegado Waldir (PSDB), o deputado mais votado em Goiás, é réu numa ação
civil pública por improbidade administrativa.
Segundo ele, a ação se refere a
sua atuação como delegado-adjunto da Delegacia de Roubos em Goiânia.
A perícia
num carro roubado e adulterado demorou 4 horas para ser feita porque, segundo
Waldir, havia só um perito na delegacia.
- A ação foi movida por conta do meu trabalho policial.
Só não foi
arquivada por causa da demora da Justiça - disse Waldir.
O deputado Alberto Fraga (DEM-DF), que já exerceu o cargo na Câmara, é
réu em ação de improbidade, em ação penal por peculato, é investigado por crime
previsto na Lei de Licitações e já foi condenado por porte ilegal de armas.
Campeão de votos no DF, ele é suspeito de remunerar a empregada com recursos da
Câmara.
No exercício da atividade policial, ele já foi acusado de homicídio.
- Fui ouvido na semana passada e levei a minha empregada, mostrei a
carteira assinada.
Já a arma apreendida num mandado de busca foi plantada no
cofre do apartamento, que era frequentado por oito pessoas diferentes.
Dos meus
inquéritos do tempo de polícia, eu tenho orgulho.
Novidade na Câmara, Shéridan (PSDB) foi a mais votada de Roraima e chega
à Casa com o apoio do marido, o ex-governador José de Anchieta (PSDB).
Os dois
são alvo de uma ação impetrada em setembro pelo MP sobre titularidade de
terras.
Segundo a denúncia, Anchieta concedeu a ela um título definitivo de
propriedade rural dentro de um programa de regularização de terras.
Shéridan já
era secretária estadual.
A assessoria da deputada afirmou que ela não foi
citada e não tem conhecimento da ação.
Um dos campeões de processos é o mais votado em Mato Grosso do Sul, Zeca
do PT.
Ele é citado em dez ações de improbidade que tramitam na Justiça, com um
suposto dano ao erário de R$ 7,5 milhões.
Zeca é vereador em Campo Grande e
ex-governador do estado.
O advogado do parlamentar, Newley Amarilla, disse que
as ações penais do "escândalo da farra da publicidade" no governo
local foram trancadas pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ) porque não se
comprovou qualquer vinculação com Zeca do PT.
No caso de 12 ações de improbidade
na esfera cível, o advogado disse que Zeca já se livrou de 2 - denúncias nem
teriam sido recebidas.
Mais votado no Rio, o deputado Jair Bolsonaro (PP) responde a um
inquérito no STF por crime ambiental, mais especificamente pesca ilegal em
Angra dos Reis.
Ele nega qualquer ilegalidade.
Já o deputado Irajá Abreu
(PSD-TO), filho da senadora reeleita e presidente da Confederação Nacional de
Agricultura (CNA), Kátia Abreu (PMDB-TO), tentou na Justiça anular uma multa de
R$ 85 mil aplicada pelo Ibama por conta de um desmatamento ilegal em sua
fazenda.
Em 2012, a Justiça Federal negou a anulação da multa.
Em nota ao
GLOBO, ele afirmou que a multa foi "arbitrária" e que acabou
"judicialmente suspensa".
A assessoria de Abreu enviou uma certidão
negativa de débito junto ao Ibama.
O ex-ministro dos Transportes Alfredo Nascimento acabou desistindo de
continuar no Senado após as denúncias que custaram o seu cargo no processo da
faxina no início do governo Dilma Rousseff, mas recebeu dos amazonenses
expressiva votação ficando em 3º lugar para a Câmara.
O processo sobre as
irregularidades na pasta foi arquivado, mas é investigado no STF por falsidade
ideológica e crime de responsabilidade quando era prefeito de Manaus.
Responde
a outros processos de improbidade no Amazonas.
A assessoria de Nascimento não
conseguiu localizá-lo para falar sobre o tema.
Campeão de votos do Amapá, o ex-prefeito de Macapá Roberto Góes (PDT)
chegou a ser preso pela Polícia Federal numa operação de combate a desvio de
recursos públicos.
Hoje, responde a seis ações por improbidade e a uma ação
penal.
A assessoria não deu retorno à reportagem.
Terceiro mais votado em São Paulo, o pastor Marco Feliciano (PSC-SP)
responde a inquérito no STF por supostamente ter funcionários fantasmas em seu
gabinete.
Seriam pessoas ligadas a suas igrejas que recebem da Câmara sem
prestar serviço.
No último despacho, o ministro Celso de Mello autorizou a
Procuradoria-Geral da República a ouvir um ex-funcionário que corrobora a
acusação.
Seu chefe de gabinete, Talma Bauer, afirma que se trata de uma
apuração e que os funcionários efetivamente trabalhavam para o mandato.
Na lista há um deputado que conseguiu uma liminar para não ser barrado
pela Lei da Ficha Limpa.
João Rodrigues (PSD) foi o segundo mais votado em
Santa Catarina mesmo tendo sido condenado em 2010 pelo Tribunal Regional
Federal (TRF) da 4ª Região por direcionamento de licitação para a compra de
retroescavadeiras. Ele conseguiu uma liminar do STJ para suspender o efeito da
condenação e conseguiu se candidatar.
Seu advogado, Marlon Bertol, afirma que
na decisão do TRF ficou registrado que não houve dolo nem dano ao erário.
Diz
que a jurisprudência "evoluiu" desde então e que seu cliente deve ser
absolvido no STJ.
A deputada Iracema Portella (PP-PI) responde a uma ação de improbidade
administrativa na Justiça Federal do Piauí.
Ela é acusada de ter usado no
início deste ano o jornal de divulgação do mandato do seu marido, o senador
Ciro Nogueira (PP-PI), para fazer promoção pessoal.
Antes do recebimento da
denúncia pela Justiça, Iracema e Ciro negaram ato de improbidade
administrativa.
Segundo eles, a publicação servia para a divulgação de
atividades parlamentares e a deputada sequer era pré-candidata.
O deputado eleito Veneziano Vital do Rêgo (PMDB-PB) tem 21 ações por
improbidade administrativa na Justiça paraibana, referentes ao período em que
foi prefeito de Campina Grande, entre 2005 e 2012.
Em março, o MP entrou com
uma ação contra Veneziano por entender que houve irregularidades na doação de
terrenos públicos do município.
O GLOBO ligou e enviou mensagem SMS para
Veneziano, mas ele não deu retorno.
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