A desastrada diminuição da tarifa promovida por Dilma aumentou a chance de racionamento de energia – e sairá caro, muito caro para o contribuinte
ISABEL CLEMENTE
No dia 11 de setembro de 2012, a presidente Dilma Rousseff anunciou uma redução de 20% nas tarifas de energia
elétrica.
A boa notícia, alardeada pelo governo como uma de suas
grandes realizações, dependeria de um subsídio temporário de R$ 3,3
bilhões, em recursos públicos.
A conta – paga com dinheiro do meu, do
seu, do nosso bolso – parecia pequena diante dos efeitos benéficos da
medida.
Quase dois anos depois do foguetório do Palácio do Planalto em
torno da redução das tarifas de energia, sabe-se agora que o preço será
muito mais alto: cerca de 14 vezes esse valor, segundo um estudo inédito
a que ÉPOCA teve acesso.
Em 2013, as despesas públicas para pagar a promessa de Dilma chegaram a R$ 22 bilhões. Neste ano, segundo as estimativas do relatório Energy Report, da consultoria PSR, mais R$ 25,6 bilhões serão consumidos.
A astronômica quantia de R$ 47,6 bilhões é maior que o corte anunciado pelo Ministério da Fazenda no Orçamento da União para 2014, de R$ 44 bilhões – uma medida do governo para tentar mostrar austeridade. Equivale a 40% do Orçamento para a Saúde neste ano. A PSR é uma das consultorias mais respeitadas do setor elétrico.
Ela assinou tanto a avaliação oficial do governo Fernando Henrique Cardoso sobre os motivos da crise do racionamento de 2001, como avalizou o novo modelo do setor elétrico, implantado em 2004 no governo Lula pela então ministra de Minas e Energia, Dilma Rousseff.
Um apagão no país ensolarado
Só aos poucos o governo começa a tornar público o tamanho do buraco nas contas públicas criado pelo populismo energético de Dilma.
Na semana passada, os ministérios da Fazenda e de Minas e Energia elevaram para R$ 13 bilhões o montante de gastos do Tesouro Nacional, neste ano, para cobrir a redução da tarifa – ainda apenas metade da projeção feita pela PSR, mas um indício claro de que a conta do contribuinte crescerá.
O rombo no setor elétrico começou a ser construído ainda em 2012. Para garantir a redução na tarifa, o governo contava com um evento que não se realizou: a renovação antecipada dos contratos de todas as usinas geradoras, cujas concessões expiram a partir de 2015.
Para ter direito ao “privilégio” da antecipação, as geradoras precisavam topar vender energia às distribuidoras do setor elétrico por tarifas reduzidas. Só a Eletrobras, estatal do governo federal, topou a intervenção de Dilma.
Desde então, a empresa perdeu R$ 23 bilhões em valor de mercado. As demais geradoras, como Cemig, Copel e Cesp, controladas pelos governos estaduais de Minas Gerais, Paraná e São Paulo, não entraram no jogo – pelos motivos estampados no prejuízo da Eletrobras. O plano do governo malogrou, logo no começo.
Governo repassará custo adicional de energia para o consumidor
O problema não foi só esse. Em nome da tarifa baixa, o governo vem cometendo erros desde 2004.
Realiza leilões em que as empresas geradoras vendem, por um preço máximo, energia às distribuidoras, em contratos de longo prazo.
Insatisfeitas com o preço fixado, as geradoras passaram a deixar de comparecer aos leilões.
As distribuidoras saíam dos leilões sem ter comprado tudo o que gostariam para formar um estoque de contratos de fornecimento de energia de longo prazo. “O governo nunca revelou o tamanho do problema”, diz um respeitado analista do setor.
A situação se agravou em dezembro de 2012, quando vários contratos de fornecimento de energia venceram, e o governo perdeu a queda de braço para antecipar as concessões. O leilão público de energia não foi realizado.
Foi como se as autoridades tivessem ignorado a necessidade de realizar uma feira para que famintos e vendedores de comida se encontrassem, com o agravante de que só o governo pode promover feiras.
Para se abastecer de energia, as distribuidoras passaram a recorrer ao mercado livre, em que os contratos são de curto prazo, e as tarifas, mais caras.
É como se as distribuidoras só pudessem fazer suas refeições no restaurante cinco estrelas mais caro do país – com a conta paga pelo Tesouro. “As distribuidoras fizeram o máximo esforço para contratar.
Não é culpa delas não ter energia suficiente em estoque”, diz Nelson Fonseca Leite, presidente da Associação Brasileira de Distribuidoras de Energia (Abradee).
Segundo ele, o deficit de energia em estoque das distribuidoras equivale a um terço da energia gerada, em um ano, pela Usina de Itaipu.
Com a queda nos reservatórios de água que abastecem as usinas hidrelétricas, as distribuidoras precisam recorrer à energia das usinas termelétricas, de custo mais alto.
Como elas não estão autorizadas repassar esse custo para a tarifa, quem paga a diferença é o Tesouro. De acordo com o governo, as despesas serão custeadas com aumento de impostos. Como isso será feito não foi revelado.
Temendo efeitos inflacionários e políticos em ano eleitoral, o governo tenta contornar a crise sem repassar, de imediato, a conta ao consumidor e nega que o racionamento seja iminente.
Na semana passada, o Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico, órgão coordenado pelo Ministério de Minas e Energia, alterou de “baixíssimo” para “baixo” o risco de racionamento de energia.
O governo também nega ter cometido erros ao reduzir a tarifa em 2012, sem um planejamento adequado. O estudo Energy Report desmonta o otimismo governamental.
Mostra que, na vida real, os reservatórios das hidrelétricas estão esvaziando mais rápido do que admitem as simulações oficiais. O consumo de luz bate recordes. Em fevereiro, subiu quase 8% em relação ao mesmo período de 2013.
O relatório afirma que “a situação está longe de ser tranquila”. “O governo não assume que está ruim porque gerencia a crise com a agenda política e não técnica”, diz Adriano Pires, do Centro Brasileiro de Infraestrutura.
O Ministério de Minas e Energia admitiu que os gastos extras serão repassados ao consumidor e que haverá aumento da tarifa de luz. Mas só em 2015, quando já tiver passado a eleição presidencial.
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