Matheus, de 14 anos, Felipe e Rubens, de 16, ganham medalha de ouro por equipe em prova que exige conhecimentos de química, física e biologia.
Para os pais, foi um suplício. “´Lá foi muito difícil”, diz o pai. “Foi muito sofrido”, brinca a mãe.
Para os professores, foi um espanto: “Eles gabaritaram a prova experimental. É um fato inédito, inclusive, na própria olimpíada”, conta o professor de física Ronaldo Fogo.
Para os adversários, uma derrota inacreditável. “Trata-se da maior olimpíada na área de ciências. Surpreendeu porque, tradicionalmente, os ganhadores de medalha de ouro são os países asiáticos”, destaca Ronaldo.
Foi em dezembro, em Teerã, capital do Irã. Com 180 participantes de 28 países, o Brasil ganhou a medalha de ouro por equipe em uma prova que exige conhecimentos de química, física e biologia.
Uma façanha de Felipe e Rubens, dois jovens de 16 anos, alunos do segundo ano do ensino médio, em Fortaleza, e da maior surpresa do torneio: Matheus, um paulistano de 14 anos, o mais jovem medalhista da história da olimpíada de ciências.
“Eu não tenho conhecimento de que um aluno do ensino fundamental, e ainda por cima nem do nono ano, do oitavo ano, ter esse tipo de desempenho”, diz Ronaldo Fogo.
Os três ficaram amigos. Pelo computador, rememoram o grande feito. “A gente sabia que tinha feito uma prova boa, mas a gente não sabia que tinha feito uma prova tão boa. O ouro foi surpreendente”, lembra o estudante Rubens Bezerra.
Mas quem é o caçula notável dessa equipe brilhante? Um adolescente de gosto atípico. “Gosto dos Beatles. São músicas limpas de se ouvir. É agradável”, diz Matheus.
Intelectual, claro. E muito tímido. Daqueles que detestam perguntas indiscretas.
Repórter: Garotas?
Matheus: Não, nada, nunca.
Tudo a seu tempo. Aos 14 anos recém completados, o barato é a coleção de gibis, o videogame. Não pense que ele se mata de estudar.
Repórter: Não tinha aquela fama de nerd da turma?
Matheus: Não.
Repórter: E se tivesse? Incomodaria?
Matheus: Não, não tem problema.
Nem aí para o que pensam ou deixam de pensar, mas de olho no futuro. Matheus sempre estudou em boas escolas particulares. Adivinhe por que os pais dele nunca precisaram pagar?
“Para o melhor aluno de cada ano eles davam uma bolsa integral, com maiores notas no final do ano. E era sempre eu”, conta o menino.
Quando soube que outra escola preparava alunos para uma olimpíada científica, sentiu-se estimulado a mudar: “Eu precisava de um pouco mais de desafio”, explica.
Prestou a prova e, claro, conseguiu a bolsa. De manhã, cursava as aulas regulares do oitavo ano. À tarde, estudava os temas da olimpíada com a equipe de professores.
Foi preciso começar do zero. Como aluno do ensino fundamental, o Matheus nunca tinha visto o conteúdo de química, física e biologia do ensino médio. Mas a ideia de um estudante confinado em uma sala e submetido a uma rotina massacrante é pura aparência. Acredite, para o Matheus, nada pode ser mais divertido do que isto. E olha que ele ficou mesmo enfurnado durante quatro, cinco horas diárias por dez meses. Foi o seu parque de diversões.
“Esse é o grande segredo do Matheus. É extremamente prazeroso para ele ficar em cima dos livros”, diz o professor.
O que há de tão fascinante em uma equação química? “Você vê o que acontece, por exemplo, quando se mistura duas substâncias”, esclarece Matheus.
O que se faz com um problema de física? “Você consegue predizer as coisas, entende como funciona tudo”, explica.
Matheus não vê só cálculo, abstração. “Você consegue ver outros mundos”, avisa.
Ciência muda a vida da gente. “Tem uma aplicação para aquilo, você vê para que serve”, diz.
A medalha de ouro pendurada no quarto é o resultado do encanto de um garoto pela ciência. Ele nem terminou o ensino fundamental e, se existisse diploma para um professor tão jovem, poderia até dar aula de física no ensino médio. Mas os pais acham que o grande mérito do filho é descobrir prazer no conhecimento.
“Aquele estigma de que estudar é chato, estudar é cansativo, e estudar é uma obrigação, isso pode ser mudado”, destaca Simone Camacho.
O professor acredita em outros talentos escondidos na escola pública, que estaríamos perdendo por falta de projetos: “Para o ensino médio, para o ensino fundamental, alguns projetos de iniciação científica para que o Brasil não se dê ao luxo de perder essa matéria-prima fantástica”, alerta Ronaldo.
Aos amigos, o reservado Matheus já confessou seu grande objeto de desejo para a próxima olimpíada, na Índia, no fim deste ano: “Ele gostaria de ser o top gold, que é a medalha de ouro mais alta do torneio. Ele está se preparando para isso, e já está estudando nas férias”, avisa o professor.
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