Culturas como a do café, cana, milho, feijão e frutas cítricas tiveram perdas.
Estiagem na agricultura foi a pior desde 1963, segundo órgão do governo.
Estiagem foi o estopim da crise no setor sucroalcooleiro (Foto: Cláudio Nascimento/ TV TEM)
A agricultura paulista pode registrar em 2014 o maior prejuízo em pouco
mais de 50 anos devido a pior seca registrada em 80 anos, segundo o
Instituto de Economia Agrícola, ligado ao governo do estado. Culturas como a do café, cana-de-açúcar, milho e feijão foram afetadas diretamente pelo calor excessivo e ausência de chuvas em grande parte de São Paulo, o que pode acarretar em perdas milionárias, ainda não calculadas por órgãos oficiais.
Celso Vegro, engenheiro agrônomo e coordenador de um estudo feito pelo instituto, afirma que é possível dizer que na atual geração de produtores agrícolas, nenhum evento climático foi tão severo ou teve um impacto tão generalizado quanto à seca de 2014.
“Quem tem menos de 50 anos, nunca viu uma anomalia climática tão grave”, disse ele ao G1.
As perdas de colheitas são mais evidentes nas lavouras consideradas permanentes, como café, cana-de-açúcar e laranja, pois o plantio acontece uma vez ao ano.
O período seco e quente ocasionou grande estresse para as fases vegetativas e reprodutivas dessas plantas.
De acordo com o IEA, o último período de estiagem grave sentido pela agricultura foi em 1963, mas, naquela época, a diversidade de cultivos era menor (o café predominava, além das pastagens).
Café
A estiagem sentida durante o verão impactou negativamente o tamanho dos frutos, que ficaram menores e “chochos” em decorrência da má formação das sementes.
Nos principais cinturões cafeeiros de São Paulo, lavouras consideradas novas, plantadas entre 2012 e 2013, perderam quase todos os seus frutos pelo estresse das plantas.
“É possível que venhamos a colher a safra do grão arábica abaixo das 28 milhões de sacas, quando o esperado seria acima de 32 milhões de sacas”, explica Vegro.
Cana
Principal commodity paulista, foi a que mais sentiu a seca.
Usinas espalhadas pelo estado pararam de trabalhar um mês antes do esperado e o segmento, segundo a Secretaria de Agricultura do estado, deve puxar para baixo o valor da produção agrícola paulista, cujo cálculo definitivo será realizado em fevereiro do próximo ano.
Segundo a última previsão do IEA, a colheita deverá alcançar 402,6 milhões de toneladas no estado na safra 2014/15, 9,4% a menos que em 2013/14.
De acordo com relatório da União da Indústria da Cana-de-Açúcar, a Unica, há expectativa de quebra da safra 2015 de até 11,7% em relação à safra passada.
Produtores do Noroeste do estado já contabilizam prejuízos. “Esse ano foi muito complicado.
A gente espera que a chuva volte e nos ajude para esta safra [2015], pelo menos para conseguirmos pagar o prejuízo que tivemos até agora”, explica Juliano Maset, que tem uma propriedade em Monte Aprazível, a 484 km de São Paulo.
Feijão, milho e soja
Produtores de milho já contabilizam prejuízo na região de Promissão, a 450 km de São Paulo (Foto: Ana Carolina Levorato/G1)
O cultivo do milho no estado teve retração 25,8% devido à anomalia climática.
Em algumas regiões do estado, como no município de Promissão, 450 km distante da capital, as altas temperaturas prejudicaram mais de 70% da produção na cidade, com perdas estimadas em R$ 16 milhões para mais de mil agricultores, de acordo com a Secretaria de Agricultura local.
“Você consegue imaginar ficar praticamente um ano sem ver a água cair com força do céu?
Eu vi isso”, afirma Luís Carlos Yogui, produtor de milho há mais de 30 anos e que vai tentar apagar 2014 da memória como um dos anos mais difíceis para se trabalhar.
A colheita paulista de soja entre 2013/2014 teve queda de 17%. Mas a disponibilidade do produto não deverá ser afetada, já que outros estados conseguirão suprir as perdas.
Na atual safra de citros, categoria que inclui a laranja, o limão e a tangerina, a maioria das frutas se apresentou "murcha", perdendo valor de mercado.
Nova realidade?
Mapa
do estado de São Paulo em tons rosados, indicando baixos níveis de
chuvas ao longo do mês de outubro (Foto: Reprodução/Agritempo/Cepagri)
Segundo a meteorologia, a estiagem se explica pela predominância de uma massa de ar seco sobre a região, impedindo a chegada de frentes frias que vêm do Sul - principais responsáveis pelas chuvas na região.
Hilton Silveira, do Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura, o Cepagri, afirma que o mês de outubro deste ano foi o segundo mais seco desde 1989, perdendo apenas para 2002.
Na região de Campinas, Jundiaí, Piracicaba, Limeira, Mogi das Cruzes e Ribeirão Preto, choveu aproximadamente 26 milímetros em 31 dias.
Em um mês considerado normal, a média é de 120 milímetros.
De acordo com Eduardo Assad, pesquisador da área de mudanças climáticas na agricultura da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, a Embrapa, o que aconteceu em 2014 deve se agravar nos próximos anos devido à elevação da temperatura global.
“É preciso trabalhar para que sistemas de manejo e plantio tolerem mais os eventos extremos”, explica.
Relatório divulgado em 2013 pelo Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas (PBMC), que realizou previsões científicas sobre o impacto da mudança climática no país, prevê redução na produtividade de quase todas as culturas agrícolas existentes e perdas econômicas causadas por geadas e secas na agricultura em torno de R$ 7 bilhões anuais até 2020.
Além disso, se nada for feito para frear os efeitos das alterações do clima – como cortar as emissões de gases e reduzir o desmatamento nos principais biomas brasileiros, como a Amazônia – os cientistas estimam que até 2050 o clima influencie na perda de 10% de tudo o que for plantado no país.