Colaboração enviada pela acadêmica de Direito Micheline Diniz Barreto.
Paul Medeiros Krause.
Procurador do Banco Central em Belo Horizonte (MG), bacharel em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais
Sumário: 1. Introdução. 2. Das primeiras manifestações conhecidas do direito natural objetivo. 3. O martírio de Sócrates. 4. Os testemunhos de São Paulo e de Santo Agostinho. 5. Gênese da autonomia do direito natural objetivo: São Tomás de Aquino. 6. Da homossexualidade. 7. Dos ilícitos contra a razão e dos ilícitos contra a natureza. 8. O direito fundamental de opção sexual carece de existência real. 9. Do direito à não-discriminação. 10. Do art. 104 do Código Civil. 11. Da ditadura da minoria. Afronta ao art. 226 da Constituição Federal. Conclusão.
1. Introdução:
1.Com indubitável maestria e atualidade, afirmou São Tomás de Aquino: “Toda lei humanamente imposta tem tanto de razão de lei quanto deriva da lei da natureza. Se, contudo, em algo discorda da lei natural, já não será lei, mas corrupção de lei” [01].
2.Em sentido semelhante é o conhecido trecho de Santo Agostinho:
“Desterrada a justiça, que é todo reino, senão grande pirataria? (...) Em tom de brincadeira, porém a sério, certo pirata preso respondeu a Alexandre Magno, que lhe perguntou que lhe parecia o sobressalto em que mantinha o mar. Com arrogante liberdade, respondeu-lhe: ‘O mesmo que te parece o manteres perturbada a Terra toda, com a diferença apenas de que a mim, por fazê-lo com navio de pequeno porte, me chamam ladrão e a ti, que o fazes com enorme esquadra, imperador. ’” [02]
3.Escrevo contra certas decisões judiciais, principalmente do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que reconhecem a existência da união estável entre homossexuais, deferindo-lhes até mesmo a adoção de crianças, decisões estas que se arrogam o qualificativo de avançadas, mas que, na realidade, não suportam uma crítica racional mais elaborada. Na verdade, tais julgados estão impregnados de uma certa ideologia da moda, encontrada, também, em veículos de comunicação em massa que nada têm contribuído para o aprimoramento das instituições em nossa sociedade.
4.No presente artigo, procurarei demonstrar que o direito positivo tem origem, encontra seu fundamento de validade e tira sua força (coercitiva) do direito natural objetivo, que lhe é anterior. Como conseqüência, a união (ou parceria) civil (ou estável) de homossexuais (ou homo afetiva) não pode ser considerada família nem tutelada pelo ordenamento jurídico, por falta de lastro na natureza humana e na lei natural objetiva. Baseia-se, como se verá, na premissa falsa da existência de um direito de opção sexual.
2. Das primeiras manifestações conhecidas do direito natural objetivo
5.Ensina-nos o saudoso professor Edgar de Godói da Mata-Machado:
“O estudo da evolução histórica do conceito de direito natural encontra suas raízes no período mítico da civilização, quando as instituições morais e jurídicas se confundem com as regras de direito, como a indicar sua vinculação profunda com a própria natureza das coisas.” [03]
6.Prossegue o erudito jus filósofo alertando para que se costuma mencionar, com razão, como uma das primeiras manifestações do direito natural objetivo o episódio de Antígona, retratado na tragédia de Sófocles. Da mesma opinião é André Franco Montoro [04].
7.Ao rei Creonte, que proibira fosse dada sepultura a Polínice, insurreto contra ele, Antígona, irmã do morto, tendo desobedecido ao decreto real, respondeu:
“Não foi do Sumo Zeus essa ordem emanada.
Nem a justiça a impôs dos Manes na morada.
Do céu não procedeu. Nem podia acudir-me
Que um decreto de rei ou ato humano infirme
Inolvidáveis leis, eternas, não escritas,
À raça dos mortais por imortais prescritos.
Não são d´´ontem nem d´´hoje; estranhas são às datas.
Têm existido sempre, imutáveis, inatas.
Por humana coação leis santas infringir
Fora da divindade a cólera atrair.” [05]
8.Portanto, com o nascimento do pensamento teológico e, mais tarde, do pensamento filosófico, surgiu, ao lado da noção de algo devido ao homem precisamente por ser homem, a convicção de existirem regras obrigatórias a que os membros da sociedade humana devem submeter-se para que esta subsista e se mantenha íntegra. Tais regras precederiam ou seriam ontologicamente contemporâneas à própria vida em sociedade.
9.Quinhentos anos antes de Cristo, Heráclito, filósofo que intuiu a perpétua mobilidade das coisas, já preconizava a existência de algo que permanece imutável: a lei natural, de que todas as leis humanas tiram a sua força. Para Pitágoras (582-497 a.C.), a gênese das leis não decorreria da vontade dos cidadãos, mas da sua conformação às leis naturais.
10.Também os sofistas ocuparam-se detidamente do direito natural objetivo.
3. O martírio de Sócrates
11.Sócrates (470-399 a.C.) sustentava a existência de um mundo objetivo e cognoscível de valores: do bem, do belo e do justo. Condenado injustamente a beber a cicuta, deu a vida pela sua crença em uma ordem objetiva de valores. Para ele, era preferível obedecer aos deuses que aos atenienses [06]. Aconselhado à fuga por sua mulher e amigos, responde:
“Credes que um Estado pode existir e não perecer, se as sentenças ditadas carecem de força, tornam-se ineficazes e são destruídas por pessoas sem autoridade?” [07]
4. Os testemunhos de São Paulo e de Santo Agostinho
12.Auxiliado pelo Prof. Edgar da Mata-Machado, poderia, ainda, mencionar Platão, Aristóteles, os estóicos e Cícero. Este contestara, energicamente, o ponto de vista segundo o qual o direito se funda “nos costumes e nas leis dos povos” ou que o critério do justo é o interesse.
13.Basta, por ora, a menção a São Paulo, no capítulo 2, versículos 14 e 15, da Carta aos Romanos:
“Os pagãos, que não têm a Lei, fazendo naturalmente as coisas que são da Lei, embora não tenham a Lei, a si mesmos servem de Lei: eles mostram que o objeto da Lei está gravado nos seus corações, dando-lhes testemunho a sua consciência, bem como os seus raciocínios, com os quais se acusam ou se escusam mutuamente.” [08]
14.Merece referência, outrossim, esta frase lapidar de Santo Agostinho:
“Só se fosse possível ao homem deixar de ser homem, poderia ele viver sem estar sujeito à lei natural.” [09]
5. Gênese da autonomia do direito natural objetivo: São Tomás de Aquino
15.No princípio, confundia-se o direito natural objetivo com as leis divinas ou religiosas. Esta tendência revigorou-se com os primeiros pensadores cristãos. Mais tarde, porém, a partir, principalmente, de São Tomás de Aquino, começou-se a compreender que o estudo da lei natural não se confunde com o estudo teológico, possuindo autonomia científica. O direito natural objetivo é extraído da realidade empírica. É cognoscível a partir da história e da realidade. Cuida-se de algo devido ao homem (ou à sociedade humana) enquanto homem (ou sociedade de homens), enquanto ser racional. Não se trata de normas dirigidas a todos os animais. É direito válido para todos os homens, independentemente de sua confissão religiosa.
16.Pontifica Mata-Machado:
“Até o século XVII, ninguém punha em dúvida a existência de normas que, não tendo sido criadas ou editadas pelo poder soberano, entretanto, possuíam força obrigatória em relação à conduta dos homens na sociedade.” [10]
17.Não pertence aos escopos deste trabalho a crítica ao jus naturalismo abstrato, que melhor poderia ser denominado jus racionalismo, nascido com o Iluminismo e a que não me filio. No jus naturalismo abstrato, o direito que se pretende perfeito e imutável é produto da razão, da abstração, é construído pela elucubração humana e não apreendido ou descoberto a partir da observação da realidade empírica. Ora, na verdade, o direito natural – que é composto de preceitos gerais e universais – é acessível à razão, mas não é produzido por ela.
18.Com Mata-Machado e Franco Montoro assevero a validade do conceito objetivo e realista de direito natural, presente na doutrina clássica. As críticas que normalmente se fazem, por falta de compreensão do tema, ao direito natural, dizem respeito à doutrina racionalista do jus naturalismo abstrato.
19.Percucientemente, assevera Franco Montoro:
“... mesmo fora dos quadros do tomismo, os ensinamentos de S. Tomás, por sua profundidade e equilíbrio, têm recebido entusiásticos elogios de grandes juristas modernos, como Ihering, Duguit, Villey e outros.
(...)
A doutrina tomista do direito natural apresenta características que muitos mestres do direito moderno desconhecem.” [11]
20.Ilustrativa é a afirmação de Ihering:
“Recriminaram-me, com razão, a ignorância das idéias de S. Tomás... Quantos erros se teriam evitado se se houvessem conservado com fidelidade as suas doutrinas! Quanto a mim, creio que se as houvesse conhecido antes não teria escrito o meu livro. As idéias fundamentais que desejava publicar já se acham expressas, com clareza perfeita e notável profundidade, por esse pensador vigoroso.” [12]
21.Cabe registrar, ainda, o parecer de Michel Villey:
“Para certo público universitário, S. Tomás seria símbolo do ´´obscurantismo medieval´´, ultrapassado pela ciência moderna. É suficiente lê-lo para mudar de opinião.” [13]
6. Da homossexualidade
22.O direito positivo e a jurisprudência não devem pretender imiscuir-se em assuntos que não lhes dizem respeito. Não devem forçar-nos a engolir verdades subjetivas, formais, desprendidas da realidade. Há assuntos que são próprios das ciências exatas, outros, das ciências biológicas, e outros, ainda, das ciências humanas. O jurista não é perito em todas as ciências, nem mesmo em todas as ciências humanas. O que é próprio de outros ramos do saber deve ser tomado de empréstimo pelo aplicador do direito.
23.Assim, o começo da vida, por exemplo, é um dado, sobretudo, biológico. O direito deve tomar de empréstimo das ciências biológicas a sua definição (concepção).
24.Dito isso, urge compreender, à luz da psicologia, em que consiste a homossexualidade.
25.Insuspeito e digno de nota é o ensinamento do Dr. Gerard J. M. van den Aardweg, Ph. D. em Psicologia pela Universidade de Amsterdã, autor de várias obras sobre homossexualidade. Suas lições são enriquecidas por mais de trinta anos de pesquisas e pela experiência terapêutica adquirida no tratamento de mais de trezentos pacientes.
26.Com efeito, observa o Prof. Aardweg:
“É óbvio que a imensa maioria do povo ainda considera a homossexualidade – ser sexualmente atraído por integrantes de um mesmo sexo, juntamente com uma redução pelo menos substancial de interesses heterossexuais – como anormal. Emprego a palavra ´´ainda´´, porque é um fato, apesar do bombardeio prolongado da propaganda de normalidade da homossexualidade veiculada pelos ideologistas sociais e políticos ignorantes e tendenciosamente subservientes que controlam a mídia, a política e grande parte do mundo acadêmico. Se a elite social deste nosso tempo perdeu o senso comum, o mesmo não aconteceu com a grande massa do povo, que talvez possa ser forçada a aceitar medidas sociais surgidas da ideologia dos ´´direitos iguais´´ dos adeptos da emancipação homossexual, mas não a mudar a simples observação de que algo deve estar errado com as pessoas que, embora fisiologicamente sejam homens e mulheres, não se sentem atraídas para os objetos obviamente naturais do instinto sexual, orientados para a propagação da espécie. Para a pergunta que muitos indivíduos perplexos fazem, buscando saber por que é possível que ´´pessoas educadas´´ acreditem que a homossexualidade é coisa normal, talvez a melhor resposta seja o que disse George Orwell: existem coisas ´´tão loucas nas quais somente intelectuais podem acreditar´´. O fenômeno não é novo: não poucos cientistas de renome começaram ´´acreditando´´ na ´´correta´´ ideologia racista na Alemanha dos anos 30. Para muitos o instinto gregário, que é uma fraqueza de caráter, e a ansiedade de ´´pertencer´´ os levam a sacrificar seu juízo independente.” [14] (grifei)
27.São eloqüentes as palavras do Dr. Aardweg. Ele continua:
“Os homossexuais militantes procuram forçar o público a admitir a idéia de que são normais, exercendo o papel de vítimas de discriminação e apelando assim para os sentimentos de compaixão e justiça e para o instinto de proteção dos fracos, em vez de convencer por meio de argumentos e provas racionais. Isto mostra claramente que conhecem a fraqueza da lógica de sua posição. A veemente emotividade dos homossexuais é uma tentativa de compensação exagerada de sua falta de fundamentos racionais. Com pessoas desta estrutura mental, é quase impossível uma discussão verdadeira, pois elas recusam considerar qualquer opinião que não endosse plenamente seu dogma de normalidade. Mas será que no íntimo elas realmente acreditam nisso?” [15]
28.O Prof. Aardweg afirma categoricamente: até hoje, nenhuma pesquisa científica identificou qualquer fator genético na causa da homossexualidade. Ele descarta qualquer causalidade biológica ou fisiológica no fenômeno. Em outras palavras: ninguém nasce homossexual.
29.O Prof. Aardweg assinala a possibilidade de superação das tendências homossexuais, rechaçando a tese derrotista de que o homossexual é irremediavelmente homossexual, diferente.
30.Para ele, sete aspectos são os mais importantes a serem considerados sobre o tema: 1.º) a autocompaixão inconsciente do homossexual; 2.º) o complexo de inferioridade sexual ou infantilismo psíquico; 3.º) a predisposição ao complexo oriunda da relação pais-filhos, que não é decisiva, sendo mais influente a falta de adaptação ao grupo do mesmo sexo; 4.º) o medo do sexo oposto, sintoma, aliás, do sentimento de inferioridade sexual; 5.º) a dependência sexual ou dependência do prazer; 6.º) o auto-humor (“auto-ironia”, “hiperdramatização”); e 7.º) a “egofilia” ou o egocentrismo imaturos.
31.Define o douto especialista:
“O termo neurótico descreve bem tais relações. (...)
(...)
A personalidade do homossexual é em parte a de uma criança (ou de um adolescente). Esse fenômeno é conhecido como ´´a criança que se queixa no íntimo´´. Alguns homossexuais permaneceram emotivamente adolescentes em quase todas as áreas do comportamento; na maior parte, a ´´criança´´ alterna com o adulto dentro deles, dependendo do lugar e das circunstâncias.” [16]
32.Para o aprofundamento do tema, remeto o leitor ao excelente livro do professor europeu, acrescentando que, para ele, homossexual não neurótico é uma ficção:
“Mas o homossexual não neurótico é uma ficção. Isso pode ser averiguado pela observação como também pela auto-observação das pessoas inclinadas à homossexualidade. Além disso, existe uma alta correlação entre a homossexualidade e as várias psiconeuroses, como as síndromes obsessivo-compulsivas e ruminações, fobias, problemas psicossomáticos, depressões neuróticos e estados paranóicos.” [17]
7. Dos ilícitos contra a razão e dos ilícitos contra a natureza
33.Por tudo o que já se viu até aqui, evidencia-se que os julgados pretensamente avançados do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul denotam que os eminentes desembargadores desconhecem do que estão tratando.
34.Consignou-se que o direito positivo, as leis de um Estado, repousam sobre leis que lhes são anteriores e independentes da vontade humana, o denominado direito natural. O direito à vida, por exemplo, não representa uma concessão feita pelo Estado ao súdito; aquele apenas reconhece a existência daqueloutro e se dispõe a assegurá-lo.
35.Não foi uma lei humana ou positiva que criou a dualidade e a complementaridade dos sexos. Homem e mulher tendem, naturalmente, a constituir uma pequena sociedade, ordenada à complementação mútua – física e psíquica – e à procriação, necessária, ademais, à perpetuação da espécie. A estabilidade, a unidade do casal – os cônjuges tornam-se como que um só em sua estreita união –, fornecem o ambiente propício para a formação da prole e também para a sua própria realização pessoal.
36.Legislar – e julgar – segundo a natureza é preciso, mas não é suficiente. É preciso também fazê-lo segundo a reta razão. Maltratando-se a natureza, ofende-se, igualmente, a razão, pois a racionalidade integra a natureza humana.
37.Há ilícitos que são particularmente graves por corromperem não apenas a razão, mas a própria natureza. Explicando melhor: o ato cometido pelo adúltero é natural. A atração pelo sexo oposto corresponde a um instinto inato do ser humano. A ilicitude do adultério não está no ato em si, mas decorre da qualidade da pessoa com a qual é realizado o ato sexual: alguém que não é o cônjuge. Sendo o homem dotado de racionalidade, e não somente de instinto, cumpre-lhe domar o instinto quando contrário à razão.
38.No caso, porém, da união entre duas pessoas do mesmo sexo, é o próprio ato que, em si mesmo, é contrário à natureza. O organismo masculino não existe para unir-se ao de outro homem nem o organismo feminino para unir-se ao de outra mulher. Que o digam os mecanismos de reprodução da espécie!
39.A conjunção carnal de dois homens ou de duas mulheres não é uma união sexual real. Na falta de órgãos que se complementem, faz-se uso antinatural de órgãos que não são sexuais, desvirtuando-lhes as funções e finalidades. Cuida-se de imitação grotesca, caricatural, do ato sexual entre pessoas do sexo oposto.
40.Também sob o aspecto psíquico, não há verdadeira complementaridade entre conviventes homossexuais. Observe-se que nessas relações imita-se a natureza, pois um dos parceiros se porta à semelhança de homem, e o outro, à semelhança de uma mulher. Ora, sabe-se que os psiquismos feminino e masculino são complementares. Em regra, o homem é mais racional e prático. A mulher, mais emotiva e detalhista.
41.São Tomás de Aquino advertia sobre a maior gravidade dos delitos contra a natureza em relação aos delitos contra a razão [18]. Como os princípios da razão fundam-se sobre os princípios da natureza, a corrupção da natureza é a pior de todas as corrupções.
8. O direito fundamental de opção sexual carece de existência real
42.Por conseguinte, impõe-se asseverar, com todas as letras: não existe direito fundamental de opção sexual. Essa realidade não se encontra na natureza. Carece de existência ontológica. Trata-se de grosseiro artificialismo jurídico. Não condiz com as características inalienáveis do ser humano.
43.Ninguém nasce com um terceiro ou quarto sexo. Aliás, a opção, que será sempre artificial, não modificará os cromossomos do indivíduo, ainda que submetido a operação para mudança de sexo: continuarão sendo XX, se mulher, ou XY, se homem. Trata-se, a pretendida opção, de rematado, disparatado artificialismo, de equívoco grotesco. Observe-se que todas as células do corpo de um homem, homossexual ou não, inclusive as dos seus fios de cabelo, são masculinas. E todas as células de uma mulher, homossexual ou não, são femininas.
44.Afirmo: não existe direito contra a razão e contra a natureza. Cuida-se de impossibilidade lógica insuperável.
9. Do direito à não-discriminação
45.Coisa bem distinta é o direito de não ser discriminado injustamente, inclusive por ser homossexual. Na substância, o direito à igualdade do heterossexual não difere do direito do homossexual. O direito à igualdade do homossexual não gera novas realidades, novos direitos, como o de poder casar-se com pessoa do mesmo sexo e adotar filhos que a natureza lhes recusou. Seria esta uma ficção absolutamente reprovável. A atribuição de direitos exclusivos ao homossexual, sim, é que é um verdadeiro discrímen: uma discriminação.
46.Note-se: a discriminação importa em não reconhecer em algum homem toda a sua dignidade; em suprimir, injustamente, direitos seus, inerentes à sua condição, à sua natureza. Não pertence à natureza do homem ser homossexual. Por conseguinte, não caracteriza discriminação – supressão injusta de direitos – a recusa do Estado em atribuir, artificialmente, à convivência duradoura entre homossexuais efeitos próprios do casamento.
47.Discriminação haveria caso fosse negado à pessoa homossexual direito assegurado a heterossexual. Nem homossexual, nem heterossexual podem casar-se com pessoa do mesmo sexo.
10. Do art. 104 do Código Civil
48.Dispõe o art. 104 do Código Civil:
“Art. 104. A validade do negócio jurídico requer:
I – agente capaz;
II – objeto lícito, possível, determinado ou determinável;
III – forma prescrita ou não defesa em lei.”
49.A respeito da licitude do objeto do negócio jurídico, esclarece Sílvio de Salvo Venosa:
“Para que seja idôneo o objeto, não basta ser determinado ou determinável e possível. Cumpre, igualmente, ser lícito. A licitude do objeto é regulada pela forma negativa: atingimos a compreensão do objeto lícito pelo conceito de ilicitude. A lei impõe limitações ao objeto do negócio jurídico.
O objeto do ato não gozará da proteção legal quando for contrário às leis de ordem pública, ou aos bons costumes.
(...)
Da mesma forma, é diluído o conceito de bons costumes, não encontrável na lei. Embora não sejam exclusivamente preenchidos pela Moral, os bons costumes são integrados por ela. (...) Não resta dúvida de que não podemos admitir negócio jurídico contrário à Moral. (...) Temos em todo o caso de levar em conta a moral predominante no espaço e no tempo.” [19]
50.Como se vê, a validade do negócio jurídico requer: agente capaz, objeto lícito, possível, determinado ou determinável, e forma prescrita ou não defesa em lei.
51.Ora, certamente, a maior parte da população brasileira, de influência cristã, considera imoral e contrária aos bons costumes o negócio jurídico da união estável entre homossexuais.
52.Não cabe aos magistrados julgar a moralidade ou imoralidade do objeto de um negócio jurídico segundo o seu senso pessoal de moralidade. É o senso médio da sociedade que deve nortear o julgador, como ensina J. M. de Carvalho Santos, comentando o art. 145, II, do Código Civil pretérito:
“Sobre o que não pode haver dúvida, a nosso sentir, é que o campo dos atos contrários aos bons costumes não vai ao extremo de alcançar tudo aquilo que a moral repele, mas tão-sòmente aquilo que o sentimento ético comum e os usos e costumes adotados condenam como imoral. (...)
É contrário aos costumes, no conceito de muitos, o que é incompatível com o sentimento geral de dever ou que ofenda à honestidade ou ao pudor público.
(...)
(...) Assim como se o fato sôbre que versa o objeto ou conteúdo do ato é de tal ordem imoral, que o sentimento médio do povo, nas condições atuais da civilização, não duvida em havê-lo, em si mesmo, como ofensivo à moral e bons costumes, por exemplo, a prostituição, o lenocínio, etc.” [20]
53.Como visto anteriormente, em verdade, a união estável entre homossexuais é negócio jurídico inexistente, por não possuir lastro na natureza humana e na lei natural. Carece de existência real e juridicidade intrínseca. Ofende a moral objetiva imutável e válida para todos os seres humanos. Além disso, o seu objeto é jurídica (inclusive pelo art. 226, § 3.º, da Constituição Federal) e materialmente impossível, pois não existe nem pode haver união real entre pessoas do mesmo sexo. Apenas para argumentar, caso tudo isso pudesse ser superado, o que não ocorre, configuraria um negócio jurídico nulo (art. 166, II, do Código Civil), ferindo de morte o precitado art. 104, II.
54.É bom que se diga: a lei humana ou as decisões judiciais quando contrariam a lei natural não obrigam no foro (íntimo) da consciência. A conseqüência disso é a desmoralização e o desprestígio do direito, em que passa a prevalecer a forma, a aparência de direito, sobre o conteúdo: o justo. Ademais, avultam as possibilidades de objeção de consciência.
55.Coisa diversa da união estável entre homossexuais é o desfazimento de sociedade de fato, em que se evita o locupletamento à custa alheia. Isso nada tem a ver com o direito de família. No desfazimento de sociedade de fato, não incidem e não devem incidir institutos próprios da família (pensão alimentícia, benefícios previdenciários, ordem de sucessão hereditária etc.). Demais disso, quem quiser beneficiar um benfeitor seu, poderá contemplá-lo em testamento, sem prejuízo dos herdeiros necessários.
11. Da ditadura da minoria. Afronta ao art. 226 da Constituição Federal. Conclusão.
56.Em verdade, alguns tribunais brasileiros têm legislado, usurpando competência do Congresso Nacional e suprimindo, arbitrariamente, da sociedade o direito de participar de decisões importantes sobre o seu destino.
57.A Constituição da República, que, aliás, já malferiu o direito natural reconhecendo a união estável (que também carece de existência ontológica: trata-se de uma imitação do casamento, casamento de segunda classe), não albergou a união civil entre pessoas do mesmo sexo.
58.Dispõe a Constituição da República, no art. 226, caput:
“Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.”
59.Ora, no art. 226, § 3.º, o próprio Estado desfere o primeiro [21] golpe na família:
“§ 3.º Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar a sua conversão em casamento.” (grifei)
60.Embora já contrária ao direito natural, ofendendo tão-somente a razão, ainda não a natureza (os instintos inatos do homem), a Carta Magna reconhece e atribui efeitos jurídicos à união estável entre homem e mulher, facilitando a sua conversão em casamento (asseverando, implicitamente, que somente o casamento atende integralmente à natureza humana e ao pleno desenvolvimento da sociedade [22]).
61.De ver-se que em alguns de seus julgados o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul [23] e outros tribunais arrogam-se prerrogativas de Poder Constituinte [24], pois, simplesmente, derrogam o art. 226, § 3.º, da Constituição Federal. Trata-se de julgamentos contra legem (Lex Mater). Não há, aí, invasão da competência do Congresso Nacional?
62.Escoram-se tais julgamentos no princípio da “dignidade humana”, que, em verdade, é postulado oriundo do direito natural. Preconizam, porém, os senhores magistrados a existência do direito natural? Ou é conveniente escolher conceitos de escolas filosóficas diversas e antagônicas para defender o indefensável? Com efeito, há quem se apegue à “dignidade humana”, embora duvide mesmo da existência de uma “natureza humana”, paradoxo incompreensível.
63.A sexualidade humana é um dado objetivo, biológico. Se se tratasse de algo subjetivo, a perda da consciência ou das faculdades mentais de um indivíduo, acarretaria, imediatamente, repercussões em sua identidade sexual.
64.Pois bem. A família brasileira, desferidas as primeiras punhaladas, verte sangue e caminha claudicante. Agora, vendam-se-lhe os olhos e levam-na à degola.
65.Qual será o próximo passo: reconhecer a legitimidade jurídica da poligamia, da pedofilia e da zoofilia? Mais adequado seria amputar a Constituição, retirando-se dela o caput do art. 226.
66.O direito é mais do que forma e do que discurso; o que o caracteriza é o seu conteúdo, o justo. Em razão disso, carece de juridicidade intrínseca a união civil de homossexuais, devendo recusar-lhe efeitos o direito positivo e a jurisprudência.
67.Pretender que o direito seja pura forma, inodora, acromática, é reservá-lo para a prática de arbítrios e da injustiça.
68.Ora, o homem é a natureza que possui. Se o direito torna-se contrário à natureza humana, torna-se contrário ao homem, tendendo à sua destruição. Se, em vez do bem comum, o direito positivo (ou a jurisprudência) promove a ruína do homem, desvirtua-se por completo a sua finalidade ou teleologia.69.As leis naturais não são desprovidas de sanção. É conhecido o provérbio: “Deus perdoa sempre. O homem, às vezes. Mas a natureza não perdoa nunca”. As transgressões à lei natural possuem graves conseqüências para o meio social.