Senador é acusado de receber mais de R$ 30 milhões em negócios da BR Distribuidora, subsidiária da Petrobras; defesa diz que não há provas nem de contrapartida
Por Renan Ramalho, G1, Brasília
O Supremo Tribunal Federal (STF) aceitou nesta terça-feira (15) uma
denúncia contra o senador Fernando Collor de Mello (PTC-AL) na Operação
Lava Jato e tornou réu pelos crimes de de corrupção passiva, lavagem de
dinheiro e comando de organização criminosa.
Ele foi acusado de receber mais de R$ 30 milhões em propina por
negócios da BR Distribuidora, subsidiária da Petrobras na venda de
combustíveis, e agora passa oficialmente a responder ao processo, ao
final do qual poderá ser condenado ou absolvido.
Por unanimidade, os ministros da Segunda Turma acompanharam, na
íntegra, o voto do relator do caso, Edson Fachin.
Votaram com ele Gilmar
Mendes, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e Celso de Mello.
Apesar do acolhimento da denúncia, os ministros descartaram várias
acusações feitas contra Collor no processo, como de peculato (desvio de
dinheiro público) e obstrução de Justiça, por suposto embaraço a
investigação de organização criminosa.
Além disso, foi descartada a denúncia contra a mulher de Collor,
Caroline Serejo Medeiros Collor de Mello, suspeita de lavagem de
dinheiro recebido de propina, e de outras quatro pessoas:
- Fernando Antônio da Silva Tiago, auxiliar parlamentar, que foi acusado de lava dinheiro para o senador;
- Eduardo Bezerra Frazão, diretor financeiro de empresas de Collor, acusado de lavagem de dinheiro de propina;
- William Dias Gomes, assessor parlamentar, acusado de lavagem de dinheiro por operar depósitos para o senador; e
- Luciana Guimarães de Leoni Ramos, acusada de lavagem de dinheiro de dinheiro de propina.
Junto com Collor, responderão como réus na ação Pedro Paulo Bergamaschi
de Leoni Ramos, ex-ministro do governo Collor e considerado operador de
Collor em diversos negócios; e Luís Pereira Duarte de Amorim, diretor
da Gazeta de Alagoas, apontado como testa de ferro e recebedor de
propina para Collor.
Em nota, Collor afirmou que provará sua inocência ao final do processo e
disse que a decisão da Segunda Turma de livrar seis pessoas da denúncia
é uma "derrota" da PGR (leia a nota ao final desta reportagem)
A decisão do STF não significa que os acusados são culpados, mas que o tribunal vê indícios de delitos.
Agora, durante o curso do processo, as defesas poderão apresentar
provas de inocência, com depoimentos de testemunhas e contestações
jurídicas.
Só ao final, no julgamento, eles serão condenados ou
absolvidos.
A denúncia contra Collor, apresentada em agosto de 2015 pela
Procuradoria Geral da República (PGR), origina-se de uma das seis
investigações sobre o senador abertas no STF, sendo cinco da Lava Jato e
outra baseada na delação da Odebrecht sem relação com a Petrobras.
Ele figura agora como o terceiro senador réu na Lava Jato; já ostentam
essa condição Gleisi Hoffmann (PT-PR) e Valdir Raupp (PMDB-RO).
Acusação
No total, Collor foi acusado de cinco crimes: corrupção passiva,
lavagem de dinheiro, organização criminosa, peculato e obstrução de
Justiça.
A principal acusação é de que, em conjunto com outras pessoas, ele
pediu e recebeu, entre 2010 e 2014, pelo menos R$ 30,950 milhões em três
negócios envolvendo a BR Distribuidora, que tinha dois diretores
indicados pelo senador.
O primeiro, para viabilizar que a rede de postos DVBR Derivados do
Brasil passasse a revender combustíveis da BR Distribuidora.
O segundo foi a viabilização de quatro contratos entre a BR e a
construtora UTC para construção de bases de distribuição de
combustíveis.
O terceiro envolveu contrato de gestão de pagamentos e programa de
milhagens da BR com a FTC Cards Processamento e Serviços de Fidelização.
Nos três casos, Collor teria atuado em conjunto com diversas pessoas, incluindo seu ex-ministro Pedro Paulo Bergamaschi.
Boa parte da denúncia descreve supostas operações de Collor para
ocultar o recebimento da propina, inclusive com a compra de carros
luxuosos, imóveis e obras de arte usando dinheiro sujo depositado em
suas empresas.
A PGR lista, por exemplo, a compra de:
- 1 Bentley Continental Flying Spur, por R$ 975 mil;
- 1 Range Rover SDV8 Vogue, por R$ 570 mil;
- 1 Ferrari 458, por R$ 1,450 milhão;
- 1 Porsche Panamera S, pago em espécie, em valor não discriminado;
- 1 Rolls Royce Phantom, por R$ 1,350 milhão;
- 1 casa de campo em Campos do Jordão (SP), por R$ 4,5 milhões;
- 1 terreno litorâneo em Barra de São Miguel (AL), por R$ 450 mil;
- 4 salas comerciais no edifício The Square Park Office, em Maceió, por R$ 953,7 mil;
- 1 quadro de Di Cavalcanti e outras obras de arte e antiguidades, por R$ 4,6 milhões;
- 1 lancha, chamada Mama Mia II, por R$ 900 mil.
O dinheiro teria sido recebido por Collor e sua mulher de diversas
maneiras, seja em depósitos no exterior e empresas de fachada,
recebimento em espécie, empréstimos fictícios e transferências para a
Água Branca e a TV Gazeta, ambas firmas do senador.
Collor é acusado de peculato (desvio de dinheiro público) por nomear em
seu gabinete no Senado dois assessores, Cleverton Melo da Costa e
Fernando Antônio da Silva Tiago, que não prestariam serviços públicos,
mas somente atividades particulares.
No total, eles receberam salários
que totalizam R$ 327,5 mil por 4 anos.
A acusação de obstrução de Justiça se baseia num pedido de Collor, em
agosto de 2014, para devolver créditos depositados em sua conta pessoal.
Para a PGR, o objetivo do senador era se desvincular dessas operações
para evitar uma investigação sobre o recebimento do dinheiro.
“A denúncia está lastreada em relatórios da própria BR Distribuidora,
tem-se quebra de sigilo bancário, análise de mensagens de celulares
apreendidos, buscas e apreensões.
Em suma, é um conjunto de provas
substancioso e não apenas baseado em delações”, disse na sessão a
subprocuradora-geral da República Cláudia Sampaio.
Defesa
Na semana passada, em defesa de Collor,
o advogado Juarez Tavares afirmou que a denúncia não traz provas
concretas de que ele recebeu o dinheiro de propina.
Além disso,
questionou que contrapartida o senador teria dado para viabilizar os
negócios da BR.
“Qual seria o ato de ofício atribuído ao senador para adquirir
vantagem?
Seria o fato de indicar diretores da BR, o que não é ato de
ofício de parlamentar.
O que fazia o senador era indicação partidária,
desvinculada de ato de ofício.
Os diretores não eram nomeados pelo
senador, mas pelo presidente da República”, disse o advogado.
Tavares também disse que ele não pode ser condenado por integrar
organização criminosa, já que esse crime só foi definido em 2013, após
os negócios realizados pela BR.
“Não há nenhuma demonstração de que essa suposta organização criminosa
tivesse o mínimo de estabilidade, porque está lastreada em quatro
contratos, o que demonstraria fragilidade”, disse o advogado.
Com relação ao peculato, disse não ser possível provar que os
funcionários não prestavam serviços públicos, já que trabalhariam no
escritório político do senador em Alagoas.
Quanto à obstrução de
Justiça, disse que Collor pediu para devolver valores que já estavam
apreendidos.
Nota
Leia a íntegra da nota de Fernando Collor:
O
Supremo Tribunal Federal impôs, no julgamento de hoje, uma primeira
derrota à Procuradoria Geral da República, pois, dos nove denunciados,
somente a recebeu em relação a três deles, ainda assim apenas em parte,
afastando cinco de oito crimes imputados, tendo os ministros da Corte,
em discurso unânime, repudiado os excessos da acusação.
Mesmo
em relação ao remanescente da denúncia, a Corte apontou o absurdo da
multiplicidade de acusações em relação a um mesmo fato, ressaltando que
nessa etapa não fazia qualquer juízo quanto à existência ou não de
crime.
O
senador acredita que, como no passado, terá oportunidade de comprovar
sua inocência na fase seguinte do processo, colhendo, mais uma vez, o
reconhecimento de sua inocência.
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