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Mas a publicação anual da qual estes dados fazem parte, o Vigitel (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico), mostrou também algo que é uma tendência não só no Brasil, mas no mundo: o hábito de fumar persiste entre aqueles com menor escolaridade e renda.
Dados recém-divulgados pelo Ministério da Saúde
também mostraram que, em 2018, 9,3% dos adultos brasileiros das 27
capitais declararam fumar - uma diminuição significativa em relação a
2006, quando o percentual era de 16,2%.
Mas a publicação anual da qual estes dados fazem parte, o Vigitel (Vigilância de Fatores de Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico), mostrou também algo que é uma tendência não só no Brasil, mas no mundo: o hábito de fumar persiste entre aqueles com menor escolaridade e renda.
O percentual dos que se declaram fumantes no Brasil cai à medida que os
anos de estudo aumentam: tabagistas são 13% entre aqueles que estudaram
durante 0 a 8 anos; 8,8% na faixa de 9 a 11 anos de estudo; e 6,2% para
aqueles com 12 ou mais anos de estudo.
A tendência também é observada entre aqueles que fumam 20 ou mais
cigarros por dia: 3,3% na faixa de 0 a 8 anos de estudo; 2,4% de 9 a 11
anos; e 1,7% de 12 ou mais anos.
A publicação não traz dados para renda mas, segundo especialistas, o
fumo também acompanha os mais pobres - afinal, sobretudo em países
desiguais como o Brasil, os mais escolarizados tendem a ser mais ricos.
Um boletim do Banco Central publicado no início do ano demonstrou, por exemplo, que em relação a um trabalhador sem instrução, o ensino fundamental adiciona 38% ao rendimento por hora; o nível médio, 66%; e o superior, 243%.
Um boletim do Banco Central publicado no início do ano demonstrou, por exemplo, que em relação a um trabalhador sem instrução, o ensino fundamental adiciona 38% ao rendimento por hora; o nível médio, 66%; e o superior, 243%.
Foi anunciado recentemente que o Brasil atingiu metas da OMS para combater o tabagismo — Foto: Pixabay.
"A associação entre pobreza e fumo é uma das relações mais consolidadas
no conhecimento sobre tabagismo", resume à BBC News Brasil Tânia
Cavalcante, médica do Instituto Nacional do Câncer (Inca) e
secretária-executiva da Comissão Nacional para Implementação da
Convenção-Quadro para o Controle do Tabaco (Conicq).
"Estas pessoas têm menor acesso à informação, como sobre os malefícios
do tabagismo, e às escolas, que hoje de uma forma ou de outra abordam o
tema.
Também têm menos acesso a tratamentos para deixar de fumar."
Também têm menos acesso a tratamentos para deixar de fumar."
De produto luxuoso a danoso.
Paula Johns, diretora da organização ACT Promoção em Saúde, lembra
também que o acesso à informação foi na história um divisor de águas no
perfil de quem fuma.
"No pós-guerra, o cigarro era vendido como um produto glamuroso.
Tinha um apelo da emancipação, que atingia os formadores de opinião, como as sufragistas.
A partir da década de 1960, 70, aumenta o conhecimento sobre os malefícios do produto, e o perfil começa a mudar", explica.
Tinha um apelo da emancipação, que atingia os formadores de opinião, como as sufragistas.
A partir da década de 1960, 70, aumenta o conhecimento sobre os malefícios do produto, e o perfil começa a mudar", explica.
"A questão do acesso à informação é a principal explicação para o fato de hoje os mais pobres fumarem mais, globalmente".
Johns aponta que isto implica em um maior impacto da participação do
tabagismo no orçamento dos mais pobres, que é menor - tomando o lugar de
custos com alimentação, educação e saúde.
Foi o que demonstrou uma pesquisa publicada em 2016, com o título
Tabagismo e pobreza no Brasil: uma análise do perfil da população
tabagista a partir da POF 2008-2009.
A partir de dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
(IBGE), os autores concluíram que 84% da população tabagista recebia
entre 1 e 3 salários mínimos per capita; 8,4% de 3 a 5 salários; e 7,5%
acima de 5 salários mínimos.
A renda média dos tabagistas, segundo cálculos com os dados de 2008 e
2009, foi de R$ 867, enquanto para não tabagistas foi de R$ 957.
Foram considerados tabagistas aqueles que consumiram produtos
relacionados, como cigarros, charutos, isqueiros e papel para cigarro.
Na pesquisa, eles compuseram cerca de 10% da população, com predominância de homens.
O consumo com estes produtos comprometeu 1,5% da renda, em média.
Na pesquisa, eles compuseram cerca de 10% da população, com predominância de homens.
O consumo com estes produtos comprometeu 1,5% da renda, em média.
"Isso mostra porque é uma medida efetiva para prevenir o tabagismo o
aumento do preço destes produtos", diz Johns, destacando a importância
de taxas e impostos incidindo sobre esses itens, o que é classificado
pela Organização Mundial da Saúde (OMS) como "a ação com melhor
custo-benefício" para redução do tabagismo.
Se toda mudança de comportamento em relação ao dinheiro é difícil, isto
é agravado, no caso do tabagismo, por tratar-se de um vício.
Aviso em maço de cigarro — Foto: G1/G1.
Tabaco e pobreza: 'Círculo vicioso'
A Organização Mundial da Saúde já intitulou uma de suas campanhas como "Tabaco e pobreza: um círculo vicioso", dizendo que ambos estão "ligados inextricavelmente".
Argumentando que o tabagismo é um dos principais fatores de risco para
doenças em todo o mundo - o principal no caso daquelas crônicas e não
transmissíveis, como diabetes e hipertensão -, a OMS diz em um dos seus
comunicados que "fumar mata as pessoas no auge de sua produtividade,
privando casas de chefes de família e nações de trabalhadores
saudáveis".
"Tabagistas também são menos produtivos enquanto estão vivos por conta de uma saúde mais fragilizada", acrescenta.
No mundo, isto tem implicações marcantes para países de baixa e média
renda - origem de 80% dos 1,1 bilhão de fumantes no mundo.
Um relatório publicado no prestigiado periódico Lancet em 2017
diagnosticou: "A prevalência do fumo e consequente morbidade e
mortalidade está caindo na maioria (mas não em todos) países ricos, mas a
mortalidade futura em países de baixa e média renda tende a ser
enorme".
Países do primeiro mundo não escapam a esta discussão, como está
acontecendo na Inglaterra, onde o governo está escrevendo um novo
projeto para alterar a legislação visando tornar o país livre do tabaco
até 2030.
O país comemora ter uma das menores taxas de fumantes da Europa, mas os
dados mostram que o hábito persiste desproporcionalmente em lares de
menor renda.
Lá, 1 em cada 3 moradores de conjuntos habitacionais fuma; entre trabalhadores manuais, o número é de 1 a cada 4.
Para ocupações a nível gerencial, a participação é de 1 para 10.
Lá, 1 em cada 3 moradores de conjuntos habitacionais fuma; entre trabalhadores manuais, o número é de 1 a cada 4.
Para ocupações a nível gerencial, a participação é de 1 para 10.
Um estudo já indicou que os homens mais pobres da Inglaterra e do País
de Gales tinham duas vezes mais chances de morrer entre 35 e 69 anos do
que os mais ricos - e a morte deles foi quase cinco vezes mais provável
de ser causada pelo fumo.
Na Inglaterra, os dados mostram também maior prevalência do fumo entre pessoas LGBT e com distúrbios mentais.
Pesquisadores avaliam que pessoas com mais vulnerabilidades têm níveis
mais altos de dependência; são mais propensas a estar perto de outros
fumantes, normalizando o comportamento; e também podem ter que lidar com
mais fatores de estresse, como instabilidade de renda e moradia
precária.
Paula Johns aponta que outro grupo sabidamente mais propenso a fumar em
vários países são indígenas - algo observado em lugares como Estados
Unidos, Canadá e Brasil.
Estas variáveis não foram consideradas no Vigitel, mas no estudo
Tabagismo e pobreza no Brasil: uma análise do perfil da população
tabagista a partir da POF 2008-2009 sim.
Entre os brancos, o percentual de fumantes foi de 9,4%; pardos, 9,9%; pretos, 12,3%; e indígenas, 12,4%.
Em relação à divisão regional, pesquisas indicam maior percentual de
tabagistas nas regiões Sul e Sudeste, que ao mesmo tempo apresentam os
melhores indicadores socioeconômicos no país.
Por que pessoas com menos escolaridade e renda tendem mais ao tabagismo, e as regiões com estas características não?
Segundo as entrevistadas, não há explicações consolidadas, mas hipóteses.
"No Sul, temos a leitura do impacto da produção de tabaco nestes
locais, como no Rio Grande do Sul, onde empresas desta indústria têm
grande poder político e econômico.
Estados com fronteiras, como perto do Paraguai, também podem ter mais fumantes, por estarem em rotas de contrabando e terem acesso a produtos mais baratos", diz Tânia Cavalcante, acrescentando que experiências locais de políticas públicas de prevenção ao tabagismo também podem explicar diferenças.
Estados com fronteiras, como perto do Paraguai, também podem ter mais fumantes, por estarem em rotas de contrabando e terem acesso a produtos mais baratos", diz Tânia Cavalcante, acrescentando que experiências locais de políticas públicas de prevenção ao tabagismo também podem explicar diferenças.
Johns lembra também de hábitos culturais.
"Alguns casos na Europa mostram uma relação entre tabagismo e cidades mais frias.
O estilo de vida pode ter um impacto também."
"Alguns casos na Europa mostram uma relação entre tabagismo e cidades mais frias.
O estilo de vida pode ter um impacto também."
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