Ela diz ao Fantástico que, em 2008, foi vítima do médium durante sessão espiritual para tratar Síndrome do Pânico. Pai estava na mesma sala, mas de costas e rezando de olhos fechados. Caso chegou a tramitar na Justiça, mas João de Deus foi absolvido. Ele nega todas as acusações.
Por Fantástico
Advogada denunciou médium João de Deus para a Justiça há dez anos.
A advogada Camila Correia Ribeiro disse ao Fantástico que foi abusada
por João de Deus durante um atendimento espiritual em Abadiânia, no
Entorno do Distrito Federal. Veja o vídeo acima.
Segundo ela, o crime ocorreu em 2008, em uma sala e seu pai estava
presente, mas não pôde ajudá-la porque o médium pediu que ele virasse de
costas, ficasse com os olhos fechados e rezasse.
O caso chegou a tramitar na Justiça, mas o líder espiritual foi absolvido das acusações
O caso chegou a tramitar na Justiça, mas o líder espiritual foi absolvido das acusações
João de Deus foi foi preso neste domingo (16), após se entregar à polícia.
Ele nega todas as acusações.
Ele nega todas as acusações.
Veja abaixo o relato de Camila e do pai, Augustinho Bento Ribeiro:
Camila: Meu
nome é Camila.
Sou de Belo Horizonte, fui até Abadiânia porque eu tinha na época a Síndrome do Pânico.
Eu tinha dezesseis anos.
27/08/2018. Eu fui com fé, eu fui eu e minha família. E ele [João de Deus] falou que o meu caso era grave, que eu tava quase morrendo. Que ele precisava me atender na sala dele, que ele ia me curar. Quando ele abriu a porta, ele falou assim: "o senhor vai entrar com ela?". Meu pai falou "vou, vou entrar".
Sou de Belo Horizonte, fui até Abadiânia porque eu tinha na época a Síndrome do Pânico.
Eu tinha dezesseis anos.
27/08/2018. Eu fui com fé, eu fui eu e minha família. E ele [João de Deus] falou que o meu caso era grave, que eu tava quase morrendo. Que ele precisava me atender na sala dele, que ele ia me curar. Quando ele abriu a porta, ele falou assim: "o senhor vai entrar com ela?". Meu pai falou "vou, vou entrar".
Augustinho:
Ele falou assim, "ó, pai, vira de costas, faça as suas orações". O
tempo todo ele falava pra mim, "pai não abra os olhos". Sim, estava
confiando... e só fazendo as minhas orações.
Camila: Falou
comigo que eu ia ser curada. Que era pra eu rezar. Eu fiz isso e ele
começou a passar a mão em mim. Passou no meu peito, na minha vagina, no
meu bumbum. E eu tava confusa, sabe, eu não tava entendendo. Eu chorava
muito. E ele falou assim: "calma, isso faz parte do tratamento, isso faz
parte da cura".
Augustinho: Nela chorar, eu pensava que ela estava recebendo uma cura. Eu nunca podia imaginar que tava na mão de um bandido.
Camila: Quando
ele pegou minha mão e colocou nele [pausa e chora] ... eu vi que tinha
uma coisa errada, porque que ele tava fazendo aquilo? Eu não sabia. [Ele
colocou minha mão] no órgão dele. Eu não conseguia falar... e não
conseguia mexer, eu não... eu não conseguia falar nada. Não sei o
porquê. [Meu pai] tava perto, muito perto, sabe?
Augustinho: Do meu lado e eu não pude fazer nada... É muito triste, é muito triste.
Camila:
E quando cheguei em Belo Horizonte... eu ia o tempo todo no banheiro
lavar a mão, esfregava, esfregava, eu tinha nojo. Coloquei fogo no meu
vestido, na calcinha que eu tava vestida. Foi a hora que a minha mãe
veio perguntar por que que eu tinha feito aquilo. Contei pra ela tudo
que aconteceu. Minha mãe ficou arrasada. Contou para o meu pai.
Augustinho: Aí
eu entrei em desespero. Minha filha do meu lado e eu não pude salvar
ela? Foi onde que eu procurei uma delegacia no dia seguinte.
Camila: E fizemos uma denúncia contra ele.
Camila foi uma das primeiras mulheres que procuraram a Justiça para
denunciar o médium por abusos, em 2008. Antes disso, outra jovem, de 16
anos, também de Minas Gerais, denunciou o médium, em 1980. Ela afirmou
que foi assediada enquanto passava por atendimento no Centro Dom Inácio
de Loyola. Ela desistiu de levar o caso adiante, mas Camila foi até o
fim.
Somente cinco anos depois da denúncia, em 2013, é que saiu a decisão da
Justiça, absolvendo João de Deus da acusação. O processo foi arquivado.
Camila: Eu
fui ler a sentença agora há pouco tempo depois que toda a notícia
apareceu. E eu fiquei como errada ainda, sabe? Dez anos! Ele ficou
fazendo isso a mesma coisa. Dez anos!
Quem julgou o caso foi a juíza Rosângela Rodrigues Santos. Ela
entendeu, na época, que o médium não enganou Camila. Alegou ainda que o
pai estava lá para ampará-la e poderia ter reagido. Por isso, absolveu
João de Deus do crime de violação sexual mediante fraude.
O Ministério Público do Estado de Goiás (MP-GO) recorreu da decisão,
mas o relator levantou dúvidas sobre o depoimento de Camila e João de
Deus foi absolvido novamente, desta vez por "falta de provas".
O magistrado que julgou o caso em segunda instância alegou que Camila
tinha síndrome do pânico, que a doença causa crises súbitas e que os
ataques deixam a pessoa incapacitada e com uma condição mental em que
ela não consegue diferenciar fantasia de realidade.
A psiquiatra Andrea Feijó de Mello discorda da explicação: "Um paciente
com pânico no momento atual vai ter uma, digamos assim, quase que um
delírio, uma criação de uma coisa fora da realidade? Não faz parte do
quadro".
Mesmo com mais de 330 denúncias, que começaram a ser feitas ser
reveladas desde o último dia 7 pelo programa Conversa com Bial e pelo
Jornal O Globo, o processo de Camila não cabe mais recurso e ele não
pode ser reaberto.
"É uma decisão definitiva e o fato de existirem novas provas ou de
outras circunstâncias que fazem com que olhando pro passado o caso
pudesse ser decidido de outra forma, isso do ponto de vista jurídico, é
absolutamente irrelevante", afirma o professor de direito pena da USP,
Alamiro Velludo.
Nem a juíza nem o relator quiseram comentar o caso.
Médium João de Deus foi preso após denúncias de abusos sexuais de mais
de 330 mulheres — Foto: Reprodução/site Casa de Dom Inácio.
Outra acusação.
Um ano após a sentença sair, em 2014, João de Deus foi novamente
confrontado por acusação de crime sexual. Desta vez, na Austrália,
conforme mostra uma reportagem especial exibida pelo programa local
Sixty Minutes.
Durante entrevista com o médium, o repórter australiano quer saber se
está conversando com João ou com uma entidade, ao que ouve a resposta:
"Com o João mesmo".
A entrevista é interrompida pela tradutora logo no começo, quando o
jornalista pergunta sobre o dinheiro cobrado dos frequentadores: "Isso é
sobre dinheiro ou sobre milagres?"
Logo em seguida, o repórter fala da acusação de assédio sexual contra
João de Deus.
O caso teria ocorrido nos Estados Unidos, em 2010, durante uma visita de João de Deus a um chamado "centro de cura", no Arizona. A vítima seria uma mulher colombiana.
O caso teria ocorrido nos Estados Unidos, em 2010, durante uma visita de João de Deus a um chamado "centro de cura", no Arizona. A vítima seria uma mulher colombiana.
"A vítima afirma que João Ferreira pegou a mão dela e colocou em seus
genitais. E tentou abaixar a saia dela. Você já atacou sexualmente
alguma das suas seguidoras?", questiona o repórter.
A tradutora de João se recusa a traduzir: "Alguém pode traduzir isso?".
O médium se levanta e o repórter vai atrás: "Só queremos entender quem
realmente você é".
Uma tradutora da equipe australiana chega e traduz a pergunta diretamente: "Já houve algum assédio sexual do senhor?".
O médium responde: "Da sua mãe".
Minutos depois da agressão verbal, João de Deus volta, solicitando ver a gravação da equipe: "Eu quero assistir".
"Ele quer ver o que nós gravamos", afirma a tradutora. O repórter responde: "Não".
João diz que vai assistir. Ele pega no braço da tradutora e o repórter reclama: "Não, por favor, não faça isso".
A reportagem acaba sem o médium responder ao jornalista.
A defesa do médium nega todas as acusações.
Espera por Justiça.
Camila aguarda agora a resposta da Justiça para os casos de tantas outras mulheres que acusam o médium.
Camila: Eu
gritei por justiça lá atrás.
Não me ouviram.
Mas eles podem ouvir agora elas. [Porque resolveu falar agora?] Primeiro porque eu não preciso ter medo.
Eu necessito mostrar para as pessoas que eu superei isso.
Eu sou forte, eu escolhi o direito por isso.
Eu luto pela justiça.
Eu fui vítima há dez anos atrás, eu não sou mais hoje.
Não me ouviram.
Mas eles podem ouvir agora elas. [Porque resolveu falar agora?] Primeiro porque eu não preciso ter medo.
Eu necessito mostrar para as pessoas que eu superei isso.
Eu sou forte, eu escolhi o direito por isso.
Eu luto pela justiça.
Eu fui vítima há dez anos atrás, eu não sou mais hoje.
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