Cada
um dos 66 textos presentes no Velho e no Novo Testamento passam a valer
como obra independente. A cada leitura e resenha, presidiário tem
direito a 4 dias de remição da pena.
Por Bárbara Muniz Vieira, G1 SP, São Paulo
Um projeto de lei aprovado pela Assembleia Legislativa de São Paulo
(Alesp) em 29 de maio vai diminuir a pena de presidiários que lerem
livros da Bíblia.
O projeto foi apresentado por quatro deputados
estaduais do PRB, partido ligado à Igreja Universal.
A remição de pena, ou seja, o direito do condenado de abreviar o tempo
imposto em sua sentença penal, pode ocorrer mediante trabalho, estudo e,
de forma mais recente, pela leitura, conforme recomendação do Conselho
Nacional de Justiça (CNJ).
Neste último caso, a leitura de cada livro
possibilita a remição de quatro dias de pena, limitado a 12 livros por
ano.
O projeto foi aprovado em dezembro de 2017 e vetado pelo governador
Geraldo Alckmin (PSDB).
Na terça (29), os deputados derrubaram o veto.
De acordo com o Projeto de Lei nº 390 de 2017, aprovado pela Alesp, a
Bíblia, que antes contava apenas como um livro, passa a ser considerada
uma coletânea de livros.
Sua leitura será dividida em 39 livros do Velho
Testamento e 27 do Novo Testamento, totalizando 66 livros.
A leitura de
cada um destes livros passa, então, a ser considerada como uma obra
literária concluída.
Após a leitura, o presidiário tem de fazer uma resenha para ter direito
a remição de 4 dias de sua pena.
O presidiário terá 30 dias para ler e
mais 10 para fazer uma resenha, que será submetida a avaliação de uma
comissão.
Projeto é inconstitucional, diz especialista
Segundo o professor do Instituto de Direito Público de São Paulo
(IDPSP) Conrado Gontijo, o projeto é inconstitucional.
“Em primeiro
lugar, a legislação penal é de competência do legislativo federal, ou
seja, do Senado e da Câmara.
Não cabe à Alesp interferir na questão da
execução penal para fins de remição.
A Constituição prevê que isso é
competência do Congresso Nacional”, explica ele.
De acordo com Gontijo, o projeto também esbarra na escolha da
recomendação da Bíblia como livro indicado para leitura.
“O Estado
brasileiro é laico.
Você não pode beneficiar alguém por ler a Bíblia e
tirar o benefício de outra pessoa ler outro livro de sua religião”, diz
ele.
De acordo com o projeto da Alesp, a remição de penas pela leitura
consiste em proporcionar aos presos custodiados alfabetizados a
possibilidade de remir parte da pena pela leitura mensal de uma obra
literária clássica, científica, filosófica ou religiosa, dentre outras,
de acordo com as obras disponíveis na unidade prisional. Gontijo
acredita, no entanto, que a divisão da Bíblia em 66 livros é um
estímulo.
“A ideia não é ruim, mas a forma que foi feita é completamente
equivocada.
O projeto cria um estímulo quase impossível de resistir por
causa do benefício e acaba preterindo outros materiais que do ponto de
vista de socialização talvez sejam mais interessantes”.
Outro lado
Em conversa com o G1, o deputado Gilmaci Santos diz que a Bíblia é o
livro mais importante para a reinserção do presidiário na sociedade.
"A
Bíblia é o livro mais lido e mais vendido no mundo, daí sua importância.
Até o ateu lê a Bíblia.
A história mostra que a pessoa que passa a
entender a Bíblia muda sua vida, é um livro que faz a ressocialização.
A
pessoa quando começa a ler a Bíblia tem mudança de comportamento e de
vida", opinou ele.
Segundo Santos, o fato do país ser laico não é impeditivo do projeto de
lei que estimula a leitura da Bíblia nos presídios.
“Quem disse que a
Bíblia é de uma religião?
O budista lê, o católico lê, até o ateu lê a
Bíblia.
A Bíblia é um detalhe nesse contexto, se a pessoa se interessar
pelo Alcorão, vai ler o Alcorão.
Não estamos dizendo que é para ler só a
Bíblia.”
Questionado se a divisão da Bíblia em seis livros não estimula a
leitura dela em detrimento de outros livros, inclusive sagrados, Santos
negou.
"Também podemos dividir o Corão em partes menores, podemos
consultar um especialista para saber como dividir e fazer isso também."
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