Julgamento foi interrompido nesta quarta-feira após dois votos favoráveis à manutenção de Fachin. Faltam os votos dos outros nove ministros do Supremo Tribunal Federal.
Após os votos de dois ministros, o Supremo Tribunal Federal interrompeu
o julgamento desta quarta-feira (21) que decidirá se o ministro Edson
Fachin, relator da Operação Lava Jato, continuará como relator das
investigações baseadas nas delações premiadas dos donos e executivos da
empresa JBS.
A ministra Cármen Lúcia, presidente do tribunal, informou que o
julgamento será retomado na sessão do plenário desta quinta (22).
Faltam
os votos dos outros nove ministros do STF.
O julgamento é motivado por uma ação do governador do Mato Grosso do
Sul, Reinaldo Azambuja (PSDB).
No pedido, o governador defende que ao
menos parte das investigações baseadas nas delações da JBS seja sorteada
para outros ministros porque não teriam relação com a Lava Jato, da
qual Fachin é relator.
Votaram pela permanência de Fachin à frente das investigações o próprio
relator e o ministro Alexandre de Moraes.
Os dois também votaram contra
a revisão dos benefícios concedidos aos executivos da JBS negociados
com o Ministério Público no momento da homologação (validação jurídica
do acordo).
Nas delações, executivos e donos da empresa apontaram a existência de
um esquema de corrupção e pagamento de propina para políticos.
As
delações resultaram em inquéritos abertos no STF para investigar, entre
outros, o presidente Michel Temer e o senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG).
Fachin foi designado relator a pedido da Procuradoria Geral da
República (PGR), responsável pelo acordo com a JBS.
O órgão aponta
conexão com a Operação Lava Jato, da qual Fachin é relator,
especialmente por desvios do Fundo de Investimentos do FGTS que também
beneficiaram o grupo empresarial à qual a JBS pertence.
O governador Azambuja argumenta, no entanto, que o caso deve sair das
mãos de Fachin porque vários outros casos narrados pelos executivos da
JBS não têm relação com desvios na Petrobras, principal foco da Lava
Jato.
Primeiro a se manifestar, Fachin lembrou que pelas regras do STF, novas
investigações devem ser enviadas ao ministro que já conduz um caso
semelhante.
"Não se verifica, em meu modo de ver, qualquer ilegalidade na
distribuição por prevenção do pedido de homologação do acordo de
colaboração premiada diante da evidência de fatos relatos conexos com
investigações em curso sob a minha relatoria", disse.
No caso da JBS, a conexão estaria em desvios no Fundo de Investimentos
do FGTS que já integravam as investigações da Lava Jato desde o ano
passado.
A Eldorado Papel e Celulose, empresa do mesmo grupo da JBS, obteve
financiamento mediante suposta propina a Fábio Cleto, ex-diretor da
Caixa e responsável pela gestão do fundo.
Revisão dos acordos de delação
No julgamento, Fachin também votou contrariamente à revisão ou
interferência nos benefícios negociados entre os delatores do
frigorífico JBS e o Ministério Público no acordo de colaboração
premiada.
Para Fachin, uma eventual revisão dos benefícios dos delatores poderá
ser feita só ao final do processo criminal, quando se for condenar ou
absolver o delator pelos crimes que ele confessou.
“No ato de homologação da colaboração premiada, não é dado ao
magistrado, de forma antecipada e, por isso, extemporânea, tecer
qualquer valoração sobre o conteúdo das cláusulas avençadas, exceto nos
casos de flagrante ofensa ao ordenamento jurídico vigente.
Se assim
agir, estará, de modo indevido, interferindo na atuação dos órgãos de
investigação”, afirmou Fachin em seu voto.
A mesma posição foi defendida pelo ministro Alexandre de Moraes:
“Não poderá o Judiciário substituir aquele acordo de vontades entre o
Ministério Público e o delator ou agente colaborador, mesmo que o juiz
não concorde desde que haja lícita escolha entre as várias escolhas
legalmente e moralmente previstas”.
Durante a maior parte da sessão, outros ministros se manifestaram sobre a questão, mas sem votar.
Gilmar Mendes, por exemplo, disse que, no caso da delação da JBS, não
haveria como rever os benefícios ao final do processo, já que o acordo
proíbe o Ministério Público de apresentar denúncia contra os executivos.
“Se se opta pela extinção da punibilidade, não haverá denúncia.
Em que
processo vai se fazer a verificação sobre a viabilidade do acordo?”,
questionou.
O ministro também disse que benefícios como esse não estão previstos na
lei e, por isso, poderiam ser derrubadas pelo Judiciário.
“Há acordos suspendendo o prazo prescricional sem nenhuma base legal.
Está se reescrevendo a lei?
Pode?
A promotoria assumiu função
legislativa no acordo?
Causas flagrantemente ilegais podem ser
homologadas, seja lá pelo relator ou submetidas a plenário?”, disse.
Após o fim da sessão, o ministro Marco Aurélio disse a jornalistas que a
hipótese de se anular a delação da JBS é um “delírio”.
Ele observou que
o acordo de colaboração premiada já prevê as situações em que o acordo
ficará prejudicado.
Marco Aurélio ponderou ainda que o procurador-geral, ao assumir o
compromisso de não apresentar denúncia contra os delatores – um dos
pontos mais criticados do acordo – considerou o fato de que o resultado
da delação será “muito maior do que uma possível condenação dos
delatores”.
“Em síntese, o procurador-geral não está na berlinda, não está sendo
julgado, vamos acreditar um pouquinho nele.
Se ele chegou nesse ponto de
assumir o compromisso de não denunciar e ele assumiu, daí o sucessor
não poder alterar esse ponto de vista, se ele assumiu esse compromisso, é
porque o resultado da delação é muito maior do que uma possível
condenação dos delatores.
É muito maior”, afirmou Marco Aurélio Mello.
Homologação
A questão sobre o papel do relator na delação – que também deve ser
decidida no julgamento desta quinta – foi proposta pelo próprio Fachin, a
partir do questionamento de Azambuja.
Em seu voto, o ministro defendeu que a decisão de homologar (validar) a
delação seja feita monocraticamente (de forma individual) pelo ministro
relator e não de forma conjunta por vários ministros.
Um dos benefícios obtidos pelos donos da JBS é o compromisso do
Ministério Público, responsável pela acusação, em não denunciá-los junto
à Justiça pelos crimes nos quais confessaram participação.
Fachin lembrou que a lei que regula as delações não prevê participação
do juiz na negociação.
O magistrado é responsável somente pela
verificação da legalidade e regularidade do acordo, especialmente para
checar se os colaboradores não foram coagidos.
“Nessa fase homologatória, não compete ao Poder Judiciário a missão de
qualquer juízo acerca da proporcionalidade ou conteúdo das cláusulas que
compõem o acordo celebrado entre as partes, sob pena de malferir a
norma prevista na lei que veda a participação dos juízes nas
negociações, dando-se concretude ao juízo acusatório que rege o processo
penal no Estado democrático de direito”, afirmou.
Janot
Responsável pelo acordo de delação da JBS, o procurador-geral da
República, Rodrigo Janot, defendeu durante o julgamento a manutenção do
caso com Fachin e também dos benefícios pactuados com os donos da
empresa em troca da delação.
Para Janot, retirar de Fachin as delações da JBS e rever os benefícios negociados com os delatores seria um “salto triplo mortal de costas”.
O procurador-geral sustentou que os casos trazidos pelos delatores
guardam relação com a Operação Lava Jato por revelarem desvios de
dinheiro de diversos órgãos públicos.
“Os fatos trazidos com indicativo de prova envolvem nada mais, nada
menos, que os três últimos presidentes da República.
Os fatos trazidos
com indício de prova dão conta que o dinheiro que irrigou os ilícitos,
que pagou a propina é dinheiro público, não é dinheiro privado, que veio
de contratos com o serviço público, com Petrobras, com Fundo de
Investimento do FGTS, BNDES e tantos outros que se entrelaçam nesses
fatos todos em apuração”, destacou.
O procurador também disse que o Ministério Público, do qual é chefe,
não poderia recusar o acordo oferecido pelos irmãos Batista, pois
revelavam crimes que estavam acontecendo no momento.
“Os crimes estavam em curso, tanto é que alguns deles foram pilhados
por ação controlada.
Como se pode recusar um acordo quando se tem
conhecimento de crimes em curso por altas autoridades da República,
porque a premiação seria alta, média ou baixa?
Teria o Ministério
Público condição de recusar e permitir que essas autoridades
continuassem a cometer o crime porque a premiação deveria ter sido essa
ou aquela?”, disse.
Ele lembrou que, assim como os donos da JBS, outros seis colaboradores
da Lava Jato obtiveram o benefício de não serem denunciados sem qualquer
questionamento judicial.
A revisão do acordo, argumentou, traria insegurança jurídica para os
novos delatores.
“A mensagem que se passa é o Ministério Público ao
acordar, pode, mas não muito.
O MP pode acordar, mas não cumprir”,
afirmou.
Advogados
Antes de Fachin, advogados do governador Reinaldo Azambuja, do
ex-deputado Rodrigo Rocha Loures e dos irmãos Joesley e Wesley Batista,
donos da JBS, se manifestaram sobre a delação.
Representante de Azambuja, Gustavo Passarelli disse que não há nada que
vincule a conduta do governador a fatos ligados a Petrobras.
Ele foi
citado por suposto recebimento de propina da JBS em troca de benefícios
fiscais no Mato Grosso do Sul.
“No próprio pré-acordo de colaboração consta que os fatos seriam
relacionados a Lava Jato ou não [...]
É possível contatar que houve
preocupação por parte dos colaboradores e do Ministério Público no
sentido de segmentar os fatos que eram tratados.
Há uma nítida divisão
de fatos, especialmente quando se começa a tratar de governadores de
estado, com capítulo específico sobre governador do Mato Grosso do Sul”,
afirmou.
Em nome de Rocha Loures, Cezar Bitencourt, pediu anulação da
homologação por Fachin, bem como o envio de investigações de pessoas sem
foro privilegiado para outros tribunais e não para o juiz Sergio Moro,
que conduz a Lava Jato no Paraná.
“Não se pode relativizar tudo, fazer todo um pacote só,
argumentativamente, puramente intelectual, e levar tudo para um lugar
só.
Tem mais juízes!
Tem mais juízes!
Não vamos botar todos esses
milhões de brasileiros em Curitiba, com argumentações aleatórias,
abstrata, sem vínculo nenhum concreto, fora dos fatos”, protestou.
Advogado da JBS, Pierpaolo Bottini foi o único a defender a relatoria
de Fachin e a manutenção do acordo de colaboração.
Argumentou que, assim
como as medidas de investigação que permitem obter provas, a validação
de uma delação é sempre feita por um único juiz.
Destacou que o caso da JBS foi distribuído a Fachin por ter relação com
desvios no Fundo de Investimentos do FGTS, e em investigação sobre a
gráfica Focal, que prestou serviços para a campanha presidencial do PT
em 2014, fatos também investigados na Lava Jato.
Depois, disse que rever o acordo nesse momento quebraria a confiança na
Justiça por parte dos colaboradores.
“Rever esse acordoo no presente
momento, quando o Estado já obteve benefícios, é um golpe brutal na
segurança jurídica, é a frustração da confiança legitima que o cidadão
deposita no poder público”.
Por fim, lembrou que os benefícios previstos no acordo podem ser
revistos caso a Justiça, ao final das investigações, entenda que a
colaboração não foi eficaz para desvendar os crimes.
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