Com a experiência de quem acompanha pesquisas de opinião desde a década de 60, sua leitura da conjuntura do país é que as instituições estão defasadas em relação ao estágio em que se encontra a sociedade.
A ansiedade por mudanças amplas é o sinal mais forte que os brasileiros estão emitindo neste momento.
– É uma sociedade mais bem informada do que aparentam seus dados de poder de consumo e educação.
Aumentou a percepção sobre o peso político do eleitor.
E as mudanças tecnológicas permitem uma comunicação social do indivíduo que jamais vimos na história.
As pessoas estão fazendo suas escolhas, como mostram as pesquisas.
É nesse contexto que se acentua a defasagem das instituições, como partidos políticos, escolas e mídia– afirmou.
A rigor, esse distanciamento entre a maioria da população e as instituições de elite, que falavam para menos de um terço da sociedade, não é recente.
Há pelo menos duas décadas, Fátima Jordão identifica esse fenômeno, que adquiriu uma dinâmica mais acelerada e profunda nos últimos anos.
Na prática, há um descompasso entre os instrumentos políticos que se tornaram obsoletos e o avanço da sociedade, mais capaz de avaliar e compreender a realidade em que está mergulhada.
A visão de que o país está vivendo o fim de um ciclo é a que melhor expressa a dimensão das transformações atuais.
Com a ressalva de que não elabora suas análises com o viés político-partidário e sim pelo ângulo da opinião pública, a especialista nessa área menciona dados recentes de pesquisas de opinião para reforçar esse diagnóstico.
A Ipsos, empresa de pesquisa e inteligência de mercado, foi a campo para fazer uma pergunta clássica aos brasileiros abordados por seus pesquisadores: O Brasil está no rumo certo?
Nada menos do que 90% das pessoas que participaram da pesquisa responderam que não, ou seja, que o país está no rumo errado.
Os entrevistados estão também dizendo, na interpretação de Fátima Jordão, que para o país retornar aos trilhos será necessária uma mudança muito mais abrangente do que apenas decidir a manutenção ou não da presidente Dilma Rousseff no Palácio do Planalto.
A avaliação da opinião pública sobre a presidente da República, aliás, foi dissecada por ela na conversa com o blog.
Em meados de 2013, quando aconteceram grandes manifestações de rua em todo o país, o índice de aprovação da presidente despencou de cerca de 60% para um nível em torno de 30% a 40% - isso em uma semana.
Depois do início do segundo mandato, a partir de janeiro de 2015, nova queda acentuada levou o patamar de aprovação para um intervalo entre 10% a 16%, a depender do instituto de pesquisa.
“Nunca no passado ocorreu uma reversão tão rápida”, observou Fátima Jordão, chamando atenção para a reação contundente da opinião pública diante da frustração com promessas eleitorais que se esvaziaram de forma ostensiva.
O que ficou evidente foi o desacordo entre as promessas de campanha e o reordenamento agudo que a presidente conduziu na economia depois da vitória nas urnas.
Confiança.
Outros dados significativos sobre o atual momento podem ser encontrados, segundo ela, na pesquisa divulgada pelo Datafolha no dia 29 de fevereiro último, que mediu o grau de confiabilidade dos principais atores políticos, aos olhos da população.
Foram avaliadas 12 personalidades proeminentes na conjuntura política do país.
Numa escala de 0 a 10, os pesquisadores pediram que os entrevistados dessem uma nota que expressasse o grau de confiança em cada uma delas.
A nota mais alta não passou de 5,6, conferida ao ex-presidente do Supremo Tribunal Federal (STF) Joaquim Barbosa.
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva ocupou uma posição intermediária na tabela, abaixo de personagens como Marina Silva, Fernando Henrique Cardoso e Aécio Neves.
E acima de outros atores políticos relevantes, como os peemedebistas Renan Calheiros, presidente do Senado, Michel Temer, vice-presidente da República, e Eduardo Cunha, presidente da Câmara dos Deputados – este na última posição.
O retrato melancólico sobre as lideranças políticas do país fornece elementos para Fátima Jordão reforçar sua visão de que se está diante do fim de um ciclo político, e que o avanço para uma nova fase só acontecerá quando se realizarem eleições gerais no país.
Nessa linha, mesmo que Michel Temer venha a substituir Dilma Rousseff no cargo de presidente, caso o processo de impeachment chegue a esse ponto, não haverá espaço para as transformações que a sociedade sinaliza desejar – e precisar, como sugeriu a especialista.
Em outras palavras, a queda da presidente não vai atender ao conjunto de mudanças que a maioria das pessoas idealiza.
“A solução a ser dada é muito mais ampla, muito mais profunda e sustentável do que uma mera queda da presidente”, reforçou.
O mecanismo político capaz de incorporar a máxima capacidade possível de mudança é justamente a realização de eleições gerais, cuja data mais provável ainda é 2018.
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